2006-07-05

Tudo parede

"marinha 2". emanuel carreiro.
Lá em baixo a pequena baía circular e o mar verde.
Verde mesmo sem literatura. Verde escuro como nos postais. Havia um cheiro bom no ar quente como se fosse mel ou um seio de mulher. Escrevo mel porque às vezes havia abelhas nas flores brancas de uma trepadeira. Hoje esse perfume chega raramente não sei de onde. E é então que tudo acontece de novo. Aqui estamos sobre a ravina. Em baixo a baía circular e o mar verde sem literatura. Longe no pequeno varadouro barcos ao sol postos aos pares como se fossem sapatos.

Nem sempre havia sol. Creio que chovia de Setembro a Maio. O sol brilhava trinta dias em cada cem. O céu descia como uma pesada abóbada madrepérola. As coisas perdiam o rigor dos contornos. As cores enchiam-se de sono. As casas prolongavam-se até às nuvens. Tudo parede.

O mar às vezes batia contra as rochas. Então era inverno e não havia flores brancas nem abelhas. Só aquela poeira branca por ali acima a salgar os ossos e a embaciar os vidros das janelas. O cheiro da maresia enchia as ruas próximas.

Até que veio o cheiro bom do teu corpo meio maduro. Escrevo meio maduro porque costumava compará-lo a um fruto aguardando a estação da escolha.

Estamos de novo sobre a ravina. Lá em baixo a pequena baía circular e o mar verde. Há flores brancas e abelhas. Há também um cheiro a mel e a maresia. Não é Setembro nem Maio. Nos teus olhos porém passam tristemente barcos ao longe.

Emanuel Félix

6 comentários:

isabel mendes ferreira disse...

o final é absolutamente Triste.

__a cor sabe tanto a cor. de mar._______________________________.



beijo Martim.


(é belíssimo o texto)

Anónimo disse...

Excelente E. Félix! Abraços...

Anónimo disse...

Amei... Boa-noite!

Ai meu Deus disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
porfirio disse...

:
apetece
»
ir
de
férias
.

abraço amigo

Su disse...

jocas maradas de maresia