2016-12-31

Pensamento assistido por Gertrude Stein


«... seja o que for que suceda durante o ano, o ano acaba sempre um dia.» (Gertrude Stein, «Ida», Lisboa, Ulisseia, 1979, pp. 10-11.)

[farpinhas] - vinte [Luiz Pacheco]


o homem que calculava

Luiz Pacheco não engana. Certeiro, indaga e mostra. E depois explode: «Não havia ali meios-termos, gente dupla, a jogar em todas as cartas do triunfo ao mesmo tempo e baralhando os naipes, perdendo ora nuns ora noutros, perdendo tempo, em suma.» E aí é um punhal de justiça: «E se há gente desgostosa e desgostante é esta, incapaz de acertar a relojoaria própria, acorrentada à sua duplicidade, ambígua, ziquezagueante, desnorteada, aos encontrões aos outros, e sempre resvalando para a valeta, porque a meta são duas, jamais se unem, e combatem-se uma à outra.»
Esta fábula de origem pachequiana ensina que há gente que não merece consideração. Dupla, desgostosa e desgostante, ambígua e ziquezaguente, tal estirpe não e muito menos convive, antes escorre...  

2016-12-18

Pensamento assistido por Adonis


"Levo comigo o meu abismo e ando. Reduzo a nada os caminhos que chegam ao fim, abro os caminhos longos como o ar, como a poeira, fazendo nascer inimigos dos meus passos, inimigos à minha medida. O abismo é o meu travesseiro, as ruínas são os meus intercessores." 
[«Salmo", in O arco-íris do instante, Lisboa, Publicações D. Quixote, 2016, p. 13. Tradução de Nuno Júdice.]

Assim é o abismo da grande poesia... 

2016-10-29

Pensamento assistido por Else Lasker-Schüler


Poder ser poeta e dizer o que diz Else Lasker-Schüler, eis um desejo. E escrever assim: «Há-de uma grande estrela cair no meu colo... / A noite será de vigília, // E rezaremos em línguas / entalhadas como harpas.» (Baladas hebraicas, Lisboa, Assírio & Alvim, 2002, p. 45. Tradução de João Barrento.) 

2016-10-23

Sobre o jornalismo (pensamento assistido por Marcel Proust)

Diz Swann, no À la recherche du temps perdu -Du côté de chez Swann (1913) [Em busca do tempo perdido - Do lado de Swann]: 
«O que eu censuro nos jornais é obrigarem-nos todos os dias a dar atenção a coisas insignificantes, ao passo que lemos três ou quatro vezes na vida os livros em que há coisas essenciais.» (Op. cit., Lisboa, Relógio d' Água, 2016, pp. 32-33.)  

Pensar nisso, pensá-lo sempre...

2016-09-29

[guia de audição]

[guia de audição]

ouve-me agora neste rasto assim tão fundo
que cruza  todo o planeta e os longes mares
de espuma que transbordam no íntimo peito.

ouve o dia o insólito dos limiares o fogo breve
os leitos correndo contra as angústias do sangue
o súbito declinar dos dias os longos trabalhos.

encosta tudo à limpidez das horas às sombras
calmas das manhãs aos horizontes marinhos
entre tudo e nada fulgurando entre os dedos.

lê o poema e a agudeza: «Dá-me mais vinho,
porque a vida é nada.»  Conclui, conclui então
que, isso sendo, tudo é, porque o nada é tudo.

2016-09-15

Pensamento assistido por Lawrence Durrell


«Creio que os artistas se compõem de vaidade, indolência e amor-próprio. É o inflar do ego, o seu transbordar para alguma daquelas frentes o que paralisa o trabalho.» 
(Lawrence Durrell, O quarteto de Alexandria: Clea, Lisboa, D. Quixote, 2012, p. 759.)  

Tolerável num artista, sê-lo-á num não-artista? - pergunto eu.

2016-09-13

Aquilino é um lugar literário

Aquilino é um lugar literário

Um escritor só o é verdadeiramente quando não cessa de nascer. De um lugar vindo, desse lugar sendo, é ao mundo que pertence, nascendo quotidianamente na mão dos leitores. Óscar Lopes, um dos grandes municiadores da aura aquiliniano, plantou-o, desde há décadas, no centro canónico literário, aludindo a esse lugar de nome Aquilino.
Dizia um outro Mestre, João de Araújo Correia, por agosto de 1971, não haver “devoção nenhuma com lugares literários”, porque, quando a houvesse, iriam à serra da Lapa os admiradores de Aquilino.
Que descansem os Mestres! Os admiradores de Aquilino irão a todo o lado e não esquecerão que o melhor Aquilino vai nascendo sempre na flor dos dedos. Admirável Aquilino, nascendo sempre e em cada dia. E foi hoje…

Viseu, 13 de setembro de 2016

2016-08-18

[memória de fogo]


[memória de fogo]

ainda lembro a penumbra de tudo
um mar  vasto de  sons  e sonhos
a rebentação dos poros na manhã
a imensa luz como aracne na pele:
um grito fundo musical nas ondas
por mim fendendo os trabalhos
como se os dias isso não fossem...

ainda lembro o horizonte vasto
o brilho visceral dos olhares vivos
a macieza dos pomos os frutos
breves e dóceis na palma da mão:
a faca então cortante o doce disso
deflagrando dos pés ao coração
como um friso de mel  ardendo…

¿que de mim ouves mulher aérea
dos ramos vindo célere copiosa
de sede em mim sendo este fogo?

2016-08-16

Carlos de Lemos prefaciador



Conhecedor de Poe e Wilde, o Carlos de Lemos prefaciador mostra-se sempre um monumento de cultural. Leia-se e aprecie-se a ginástica do intelecto lemiano.

2016-08-06

[“ouves eu”, sinestesia & pontuação: «Nave de Âmbar» de Porfírio Al Brandão]


[“ouves eu”, sinestesia & pontuação: Nave de Âmbar de Porfírio Al Brandão]



Integrando-se em tautologia na coleção “prazeres poéticos”, esta Nave de Âmbar avança no espaço e distende-se no tempo, sendo, no passo, lugar sagrado, poético, iniciático.  Afirmando-se navio residual, é de estilhaços vitais que a viagem se faz, perscrutando-se espelhos, vitrais e estrelas. É de um tempo antigo que o Poeta fala, de um espaço contíguo, habitável, quotidianamente interior, restaurando raízes e frutos memoriais.
Do silêncio vindo, dele sendo, é desse ruído o “navio de espelhos” de Al Brandão. Repito, do silêncio, dos “cristais da respiração”, do nome, da nomeação. [poema da p. 7.]
Navegando desde há anos, esta poesia brandoniana mantém-se visceral, do coração, cordial, funcionando o músculo como o ouriço de Derrida, abrindo-se e fechando-se, mostrando o dentro e o fora. Na pele e no reverso, na pele permanece o vulcão de palavras [poema da p. 10], declinando órgãos, biologias, geografias, bocas e falhas, encontros e desencontros… Rompendo, o fundo material decapita-se em raros golpes de agramaticalidade – de pontuação, v.g., em boa parte da Nave.
Do corpo sendo a poesia, eis que ele armazena, engaveta e dissemina como um formidável armário de transcendências simples colhidas na pétala nox.
Cheio, pleno de trabalhos do olhar e do coração, esta coletânea é um livro bem e malpassado, com agradáveis ecos al bertianos, plathianos e cesarianos. Não há morte para este livro [poema da p. 44], que é uma ardência e fogo admonitório a que aplico, neste fim, o transfigurado passo do esgar à Cesário Verde: “milady poesia, realmente é perigoso contemplá-la.” A poesia, um risco, um fogo – esta, a de Porfírio Al Brandão.
Viseu, 6 de agosto de 2016
Martim de Gouveia e Sousa

                                                                     

2016-07-28

[alexandria-1]


[alexandria-1]

na noite nua de cigarro em punho o homem dizia palavras e sonhos
sentava-se na brisa do tempo dilatava o tronco ao sabor da beladona
e nem a cidade ardida culpada de todo o transe encontrava punição
que não fosse aquele ardor dentro do ativo silêncio da escuridade...
e dentro de tudo sobre o tudo disso calmo esse humano sorvia arak
todos os perfumes sonoros do buezim vindo como o ar nas palmeiras
serpenteando no prismático dos olhos e nas junturas dos velhos lábios.]
e lia joyce com espanto diziam aqueles outros que nada liam e sabiam]
em lengalenga breve aperrada nas sílabas como se urbe não existisse...]
tudo em excesso era pecado coração na boca nas mãos nos olhos
sabendo que a teologia das palavras explodia no centro da paixão 
que dentro da cidade um só corpo neste corpo podia dentro estar
nada os rubros tarbushes podendo esconder deste fogo desta sede.   

2016-07-12

A tradução em Aquilino e o grito de Pound

A tradução em Aquilino e o grito de Pound

Não é preciso pensar para logo concluir do longo trajeto de Aquilino Ribeiro como tradutor, tal se provando, década a década, durante cerca de meio século. No entanto, é na sua fase nascente como homem de letras, na primeira década do século XX, que mais essa forma de aprender o mundo mais o toma e assoberba e com os resultados que sabemos – poderia ou poderá um grande escritor emergir de outro modo, sem esse exercício disciplinado e filológico?
Como Pound, Aquilino foi um centro de tecnicismo e profissionalismo. A escrita deveria ser trabalhada em buril oficinal até ao resgate da receção. No entremeio, como o diria o Steiner, há que aprender de cor, com o coração, cordialmente, para melhor ler o mundo, vertendo-o em palavras pesadas em torno laboral que estratifica e dá acesso aos mundos da criação.
Como Eliot viu Pound assim nós devemos olhar Aquilino como “il miglior fabbro”, uma verdadeira fonte de energia ou uma fulgurante enciclopédia do fazer. Na retaguarda, iluminando em catáfora, só as bases sólidas da versão, da tradução e da regência vocabular – uma orquestra da composição, diga-se, que ousava abrir o mundo com a certeza das palavras e da inscrição filológica. Assim, afinal, as raízes de uma árvore incomensurável!...    

Viseu, 12 de junho de 2016

Martim de Gouveia e Sousa

2016-07-10

Aquilino e as mulheres


Aquilino e as mulheres

Nem Eça e muitos menos Camilo assim desferem com a sua escrita, como Aquilino, torrentes de luz e força vital. Tal particularidade, pouco usual na literatura portuguesa, percorre a maior parte da obra do romancista de que falamos e é sempre sinal diferenciador, importante. Esse vitalismo que Seabra Pereira há não muito exalçou em ensaio modelar e produtivo, em boa hora galardoado com o prémio de ensaio Jacinto do Prado Coelho, é um lugar de muitos exemplos e de multímodas possibilidades.
Vamos ao caso das mulheres e à sua grácil presença nas inúmeras páginas do operoso escritor de Geografia sentimental. Pego quase ao acaso em É a guerra e logo topo com uma vasta, comovente e erótica visão da figura feminina. Por exemplo:

1.       “Ali na Avenida de Orleans, a rapariga de fichu vermelho, nada feia, que vende periódicos e flores e passa por liberal das suas graças, não tem mãos a medir.” (p. 17.)
2.       “Os olhos dela que são bonitos andam pisados com o medo. Alta, elegante, um tanto pálida, género faubourg, é a redolente rosa-chá do prédio.” (p. 38.)
3.       “Tampouco se veem, como que a sobrenadar, as silhuetas finas e altas de certas parisienses, deusas esplêndidas.” (p. 102.)
4.       “No segundo andar, sobre a rua moram os Legrand, que têm nurse inglesa. Deve orçar entre os catorze e dezasseis anos e, na sua formusura picante, é assim como belas e disparates coisas, tulipas, leite, luar, vinho velho, sonho, amalgamadas numa só.” (p. 172.)

Sem especial norte, abro Alemanha ensanguentada e recolho, como exemplo, as seguintes tiradas:

1.       “… e a menina sardenta, de cabelos de oiro, que se me inculcara estudanta de Cambridge.” (p. 17.)
2.       “Quási nenhuma desordem; na vaga de povo exultante e frenética o ouro pálido das cabeças nuas das raparigas, estas cabeças de Madona tão comuns no Norte, era garantia de idealidade.” (p. 92.)
3.       “De facto a cabeça da pequena, entre a faiança especiosa, tem não sei quê de espiritual e sonhado. Admiro-lhe o cabelo esparrilhado como leve nuvem de ouro sobre as têmporas, o nariz fino e de arrebite, o creme do rosto translúcido, miudinha de talhe, mais francesa que germânica, antes do Hanovre que da Prússia, e lembra-me aquelas figuras pré-rafaelitas cujo movimento era sacrificado à forma  e a forma sujeita ainda às linhas gerais da construção.“ (p. 109.)
4.       “No chá para que me convidou o Dr. Schwenke, diretor da Biblioteca Nacional, servia uma menina russa de deslumbrante beleza. O lume da sua face parecia ofuscar como o sol. Mal me atrevia a erguer para ela os olhos, não obstante a vontade interior de a adorar. E pela modéstia e compostura, aliada à graça e louçania, me lembrou aquela Natascha da Guerra e Paz que toma lugar no coração como conhecida e amada nossa.” (p. 119.)

São imagens fortes, vibráteis e vivas as imagens de mulher que se levantam das páginas aquilinianas. Fendendo a vida, esta erótica literária é muito real e muito do escritor. Ardendo, ardendo sempre, o desejo é fogo e captura, vida e morte, prisão e libertação, como o diz, aliás, o fulgurante explicit de Um escritor confessa-se:
“Passada a fronteira, lá para Bayonne, subiram duas bonitas francesinhas. Ao Diabo a sisudez e o medo da vida!” (p. 401.)
Viva, pois, a vida e os claros lumes das mulheres que nela vemos!...
Viseu, 10 de julho de 2016

Martim de Gouveia e Sousa

2016-07-04

Escritores leem escritores: Vergílio Ferreira lê António Ramos Rosa


«A reler poemas do Ramos Rosa. Magnífico poeta. O ar, a luz, a cal, o mar, a árvore, a casa - mundo da discreta alegria da vida, da gratidão do viver. Uma expressão espantosa: "uma ave subscreve(ndo) o céu inteiro.» (Vergílio Ferreira, Conta-corrente (1969-1976)-I, Amadora, Livraria Bertrand, 1981 (2), p. 251.)

2016-07-03

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira (V)


«A minha pátria é a imaginação.»
(Vergílio Ferreira, Conta-corrente 1 (1969-1976), Amadora, Livraria Bertrand, 1981 (2), p. 275.)

2016-06-26

Escritores leem escritores: Vergílio Ferreira lê Eça de Queirós

«Tomo  A cidade e as serras, releio pela centésima vez algumas páginas da segunda parte. E um prazer infinito inunda-me na alegria da serra, no prazer sensório da realidade inventada pela magia da palavra do maior artista dela na nossa literatura. E a cada passo estremeço de uma delícia indizível na "água nevada e luzidia" da fonte, no grande salão em que o ar circulava "como num eirado", no vinho  "seivoso", no grande salão vazio "com uma sonoridade capitular". Todo o "estilo" de Eça se nos dirige aos sentidos que vibram não com a realidade conhecida mas com o prazer que está lá e só na memória se conhece ou na translação dessa realidade que nela vibra e só num sobressalto se conhece como presença oblíqua e incerta. Assim o vinho e a água e tudo o mais é na escrita de Eça que nos sabem  maravilhosamente - não no vinho e água que bebemos.» (Conta-corrente (1969-1976), Amadora, Livraria Bertrand, 1981 (2), p. 267.)     

2016-06-25

O mar em Aquilino Ribeiro



O mar em Aquilino Ribeiro
Em ensaio que deveio célebre[1], Urbano Tavares Rodrigues, ao rechaçar quaisquer rótulos limitativos para um escritor plural como Aquilino Ribeiro, vinca desde a primeira página o desejo de acrescentar ao inventário dos topoi aquilinianos, e dos seus processos narrativos, a tópica do mar, tanto mais que não abundariam no escritor beirão “grandes quadros do mar”, nem “sequer grandes referências”, passando então para a exploração do romance de temática marinha A Batalha sem fim (1932) que ocupará a parte final do ato hermenêutico, não sem antes passar por obras como O homem que matou o diabo e O arcanjo negro (1947). No conjunto, a lição é a de que Aquilino, para além de escassamente recorrer ao mar como processo criativo, só de longe o faz participante de um quadro que nunca chega a ser vivência profunda. Mas será assim?
Não, não só não concordo com a desafeição tipificada em Aquilino no atinente ao mar, não obstante os alguns exemplos apresentados de um certo usus, como acho mesmo que a avançada tópica do mar é estratégica em boa parte da criação do autor de  A Casa Grande de Romarigães (1957), independentemente da vertente genológica. Por exemplo, em É a guerra (1934) recolho as seguintes e mostratativas imagens:
1.       “Às dez da noite, Paris sussura como o mar.” (p. 38).
2.       “Avenidas e bulevares enxameiam de gente, muita gente que vai e vem ao fluxo de mar.” (p. 40).
3.       “É que cada um luta por se não deixar subverter no mar interior de pranto.” (p. 52).
4.       “Destruí-la é como apagar um fanal no mar escuro.” (p. 295)
É a guerra é um livro duro, que permite, por exemplo, apodar Aquilino de germanófilo no contexto da Primeira Guerra Mundial. Deixa ainda esta admirável obra entrever alguns aspetos negativos assacáveis ao próprio escritor, como, por exemplo, os “problemas” da coloração da pele de João Chagas, da pessoa em si, que poderão permitir perigosas extrapolações. Mas um homem é isto: o seu momento e a sua sensibilidade, sem redes ou escoras.
Voltemos, no entanto, à tópica do mar:
“Não saí hoje à rua por isto tudo e ainda porque os movimentos do mar das multidões, muito mais se os observarmos duma janela com os olhos enquanto o cérebro vai seguindo em seus reflexos, são tão brutais e incompreensíveis como o fluxo e refluxo do mar. Não sou poeta, adoro o mar quando me banho nele, mas deixa-me totalmente indiferente quando o contemplo do alto das arribas. Não penetro a razão, como devo dizer, cosmológica de massa de água tão extensa e insubmissa à vontade do homem. Pois a multidão é para mim como o mar, cega em seus impulsos, absurda nas finalidades.” (p.272)

Mar adentro, é esta a poesia de Aquilino Ribeiro - um vasto e sussurrante mar com aproximação a Alberto Caeiro. O mar, pois então…
viseu, 25 de junho de 2016
martim de gouveia e sousa




[1] Refiro-me ao ensaio “A tópica do mar em Aquilino Ribeiro”, que Urbano Tavares Rodrigues apresentou, em Viseu, na I Jornada Aquiliniana organizada pelo C.E.A.R., e que veio a ser publicado nas revistas Colóquio/Letras (nº115-116, de maio-agosto de 1990) e Cadernos Aquilinianos (nº1, de maio de 1992), bem como noutras compilações ensaísticas do autor de Bastardos do sol.

2016-06-22

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira (IV)


«Como é detestável falar de arte para o grande público. Detestável mesmo vivê-la em grandes grupos. A arte é um ato solitário, uma questão a resolver entre nós e nós. Como todos os excessos de ser. A arte é um excesso de nós.» (Vergílio Ferreira, Conta-corrente /1969-1976)- I, Amadora, Livraria Bertrand, 1981 (2), p. 216.)

2016-06-17

Pensamento assistido por Alberto Manguel (III)


"A arte avança por meio de derrotas, e a ciência aprende maioritariamente com os erros. As nossas ambições são definidas tanto pelo que não alcançamos como pelo que alcançamos, e a Torre de Babel continua inacabada, mais como um monumento à nossa exultante audácia do que como um memorial aos nossos falhanços." (Alberto Manguel, Uma história da curiosidade, Lisboa, Tinta-da-China, MMXV, p. 58.)

2016-06-16

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira


"Mau sinal, a rapidez. Não se atingem as raízes do sentir."
(Vergílio Ferreira, Conta-corrente (1969-1976)- I, Amadora, Livraria Bertrand, 1981 (2), p. 165.)

2016-06-14

Pensamento assistido por Alberto Manguel (II)

«Escrever um livro é resignarmo-nos a falhar, por muito honroso que seja esse falhanço.»
(Alberto Manguel, Uma história da curiosidade, Lisboa, Tinta-da-China, MMXV, p. 18.)

2016-06-13

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira


"Em arte, até o ver bem é fingido; mas só com essa ficção é que se vê."
(Vergílio Ferreira, Conta-corrente (1969-1976), Amadora, Livraria Bertrand, 1981 (2ª), p. 164.)

2016-06-12

Pensamento assistido por Tomaz de Figueiredo

"Eu sei que os padres-mestres da prosa despida, os campeões do charro, me empurram supostas arqueologias. Sou de pedra. É cascar."
(Tomaz de Figueiredo, Dicionário falado. Variações linguísticas, Lisboa, Editorial Verbo, 1970, p. 64.)

2016-06-11

Pensamento assistido por Alberto Manguel


"Ensinamo-nos a perguntar «quanto custa?» e «quanto tempo demora?», em vez de «porquê?».
(Alberto Manguel, Uma história da curiosidade, Lisboa, Tinta-da-China, MMXV, p. 12.)

2016-06-09

Pensamento assistido por Tomaz de Figueiredo (2)


"Não acusou Aquilino, em Abóboras no Telhado, que hoje, em Portugal, todo o bicho-careta se diz escritor?" (Tomaz de Figueiredo, Dicionário falado. Variações linguísticas, Lisboa, Editorial Verbo, 1970, p. 48.)

Pensamento assistido por Tomaz de Figueiredo


"Porque vezo é dos vaidosos despreçarem dos que se atirem ao que eles são incapazes."
(Tomaz de Figueiredo, Dicionário falado. Variações linguísticas, Lisboa, Editorial Verbo, 1970, p. 7.)

2016-06-05

Pensamento assistido por Herberto Helder

"Ouço o mar e o vento à frente e atrás da montanha solitária e poderosa. Depois encosto a cara à terra profundíssima para escutar o seu húmido sussurro atravessando-a toda e passando por mim. E então poderei morrer."
(Herberto Helder, Os passos em volta, 4ª edição emendada, Lisboa, assírio e alvim, 1980, p. 145.)

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira (V)


"Uma das tragédias do casamento é que quando alguém se casa não se casa só com uma pessoa, casa-se sempre com uma data de gente."
(Vergílio Ferreira, Conta-corrente (1969-1976)- I, Amadora, Livraria Bertrand, 1980, p. 76.)

2016-06-04

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira (IV)


"Porque é que são geralmente os professores ignorantes os que mais exigem?"
(Vergílio Ferreira, Diário inédito (1944-1949), Lisboa, Bertrand Editora, 2008, p. 84.)

2016-06-02

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira (III)


"Porque escrevo eu livros? Ora! Pela mesma razão que um albardeiro faz albardas, quando as faz por gosto." (Vergílio Ferreira, Diário inédito (1944-1949), Lisboa, Bertrand Editora, 2008, p. 48.)

2016-05-31

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira (2)


"A fidelidade na vida afetiva é o mesmo que a coerência no domínio intelectual - ambas são produto da impotência."
(Vergílio Ferreira, Diário inédito (1944-1949), Lisboa, Bertrand Editora, 2008, p. 46.)  

2016-05-29

Pensamento assistido por Vergílio Ferreira


"Vamos na vida como um automóvel na noite: o que está para além dos faróis ignoramo-lo."
(Vergílio Ferreira, Do mundo original (Ensaios), Coimbra, Vértice, 1957, p. 14.)

2016-05-19

Pensamento assistido por Don DeLillo (3)


"Passado, presente e futuro não são artifícios da linguagem. O tempo desdobra-se nas costuras do ser. Passa através de nós, cria-nos e molda-nos."
Don DeLillo, O corpo enquanto arte, Lisboa, Relógio d'Água, 2001, p. 99. 

2016-05-18

Pensamento assistido por Don DeLillo (2)


"O tempo é a única narrativa que conta."
Don DeLillo, O corpo enquanto arte, Lisboa, Relógio d'Água, 2001, p. 92.  

2016-05-17

Pensamento assistido por Don DeLillo


"Nós somos feitos de tempo. É essa a força que nos confere uma identidade própria. Basta fecharmos os olhos e sentimo-la. É o tempo que define a nossa existência."
                                                                             [Don DeLillo, O corpo enquanto arte, Lisboa, Relógio d' Água, 2001, p. 92.]

2016-05-10

[história]

[história]

que exercícios e visões te restam, caminhante da história?
talvez uma ginástica do estilo, um modo impossível cerce,
um excesso de vontade ou um violento e pacífico grito…
como no poema escrito, todas as tradições são séculos,
todos os líquidos nos afogam nessa permanência indo-se.
assim irrompe um desejo de repartir a partida e permanecer.

2016-05-05

um aforismo do sr. Pantaleão


Diz  assim o pessoano Pantaleão:

«Vive a tua vida; não sejas vivido por ela.»

Mas quem não concorda?

2016-05-03

Pensamento assistido pelo Sr. Pantaleão


Incisivas como lâminas, as Visões do Sr. Pantaleão são arrebatadoras. Esta, por exemplo!

VISÃO [DOS CANALHAS]

Esta é a visão dos canalhas.
As fadas e os deuses tinham o poder de se transformar em vários bichos e cousas. Hoje não há fadas nem deuses, mas sim uns outros entes que têm o mesmo condão: são os canalhas.
Enquanto o corpo está vivo tornam-se sanguessugas. Quando o corpo está morto, tornam-se vermes. Lá de comer não deixam eles.
(Fernando Pessoa, Cartas, visões e outros textos do Sr. Pantaleão, Lisboa, Assírio & Alvim, 2014, p. 57.)


2016-04-10

Pensamento assistido por Antonin Artaud


Em "Heloísa e Abelardo" lemos, entre outras, as seguintes frases sobre a jovem:

"Tem mãos que envolvem livros em cartilagens de mel. Tem seios de carne crua, tão pequena que a ser premida faz enlouquecer; tem seios em dédalos de fio.» (p. 22.)

Heloísa, onde estás?

2016-03-16

O desporto em Vergílio Ferreira – o ténis em "Onde tudo foi morrendo" (1944)

O desporto em Vergílio Ferreira – o ténis em Onde tudo foi morrendo (1944)

Obedecendo ainda ao desenho neorrealista, o romance vergiliano Onde tudo foi morrendo contém suficientes atrativos que o fazem um objeto necessário. Não obstante o banimento a que o autor o votou da sua tábua bibliográfica imprimível, nunca o livro deixou de ser falado e desejado. Objeto de culto e de perquirições alfarrabísticas, a obra ficcional em análise, publicada em 1944 na apreciada coleção “Novos Prosadores” da Coimbra Editora, era já uma pedra do LIVRO que o romancista Vergílio Ferreira viria a escrever.
O desporto é uma compresença em Vergílio Ferreira, como havíamos visto com o primicial romance, onde o futebol fora matéria abundante. Agora é o ténis, atividade que acaba por separar as classes sociais em presença: João aprecia de longe a estranha dança do patrão Nunes correndo atrás da pequena bola “com uma coisa do feitio de uma pá” (p. 38). E chega a ser notável o pensamento interior discrepante do jovem João, apreciando o engraçado jogo: “Um de um lado, outro de outro e uma rede no meio como as que se põem à volta dos rebanhos!» (p. 38).

Ainda bem que mais para o fim do corrente ano poderão os leitores privar com este romance que até hoje tem estado quase inacessível!