
Estaço, nascido em Évora, em 1570, estudou Latim, Artes, Teologia e Filosofia, nas Universidades eborense e de Coimbra, afirmando-se ainda como poeta e homem clerical - foi, lembre-se, cónego penitenciário na Sé de Viseu. Não espanta, pois, que, quando entrou na prisão da Inquisição de Coimbra, em 28 de Julho de 1614, já o seu nome fosse estimado nas letras portuguesas, tanto mais que dez anos antes publicara, na cidade universitária, “Sonetos, Canções, Éclogas e Outras Rimas”, livro saído dos prelos do impressor da Universidade Diogo Gomes Loureiro.
Ora o que se passou então com Baltazar Estaço na nossa cidade? D. João Manuel, bispo de Viseu, depois de colocado ao corrente de que o cónego Estaço, segundo denúncias, tendo nos braços as confessadas cuida ter Nossa Senhora e que todos os ósculos e “tocamentos” havidos, mesmo que na cama, não mais facultavam do que uma “comunicação santa”, resolve aconselhar-se com a Inquisição de Coimbra. Na inquirição efectuada, depuseram dez testemunhas, tendo a sexta delas, Ana Duarte, referido que o cónego, quando beijava ou abraçava, dizia: “- Bons medronhos são estes!”.
Já no início de 1615, António Feio da Horta emite um parecer sobre o caso, avançando ser voz corrente que os criados do Senhor Bispo instruíam as testemunhas no Fontelo, sugerindo-lhes o que haveriam de dizer. Reagindo ao parecer, o Bispo Inquisidor Geral resolve transferir o cónego-poeta para Lisboa, aonde chegou em 5 de Março de 1617. Aos 16 dias do mês, declarou Estaço sofrer da enfermidade de frieza que só se desvanecia com a aproximação da carne feminina. Protegido e talvez compreendido, Baltasar Estaço não é dado como negativo ou condenado à fogueira, tendo, no entanto, ficado privado “perpetuamente de suas ordens” e impossibilitado de entrar em Viseu.
Banido da cidade, resta uma obra invulgar que importa conhecer. Existem mesmo alguns manuscritos datados de Viseu e assinados pelo punho do Poeta. Quanto à eventual fragilidade humana, pouco importa dizer. Antes interessa, por exemplo, relembrar o final do fulgurante soneto “A certa donzela que se metia freira”, que é ainda um eterno louvor aos actos de fé de uma “bella Joana”, que “desprezando toda a causa humana, / Assy levantaes vossa humanidade, / Que sendo humana sobe a ser divina.”
(Publicado hoje, no Jornal do Centro )
2 comentários:
Grande Estaço e bom poeta. Abraço.
Ah grande Estaço! Com boa poesia...
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