2006-09-23

explicação da fábula & tragédia modernista



Intencionalmente comunicativa, a fábula é narração e é intriga, correndo célere para o recorte moralizador. Tal segmento moral, de nome epimítio e quase sempre a última frase, sintetiza o ensinamento fabular. Assim esta coluna de anos, procurando mostrar.
Para ser mestre modernista, foi Almada a Madrid e teve de existir a regiana “presença”. Nesse mesmo ano de 1927, abandona Judith Teixeira e ruma a Espanha, mal olhando as provas de “Satânia”. Em breve, imersa na década seguinte, sobre si cai o silêncio. Desconhecido como poeta na década de 20, Luís de Montalvor é a alma da editora Ática e morrerá tragicamente nas águas do Tejo, em 1947. No início da década de 20, morre em Rilhafoles Ângelo de Lima, poeta enigmaticamente lúcido. Santa Rita Pintor e Sousa Cardoso morrem ignorados, participando António Ferro na humilhação de Fernando Pessoa, ao distinguir Vasco Reis e ao preterir a “Mensagem”. Breve, o fígado cede. Ao tempo, Raul Real, o da “literatura de Sodoma”, apodrece nas tabernas do Bairro Alto. Botto, defendido por Leal e por Pessoa, extravasa a decência e abandona o país, morrendo, estranhamente ou não, em 1959, como Judith Teixeira, morta desde há muito para a literatura. Em 1916, Mário de Sá-Carneiro, não conseguindo esmagar-se debaixo das rodas do metro, na estação do Pigalle, suicida-se com estricnina num hotel parisiense. Alexandre d’ Aragão, mais eficaz, encosta o pescoço aos “rails” de comboio no Choupal e morre trucidado, em 1930. Mário de Saa, que viu recentemente publicada a sua obra poética pela IN-CM, nenhum livro de poesia publica durante o seu período de vida. Em 1949, Carlos Queiroz sucumbe, subitamente, em Paris. Quase ao mesmo tempo e no mesmo ano, em Castelo de Vide, morre Francisco Bugalho, a quem há pouco falecera o prometedor poeta e filho Cristóvão de Pavia.
O esquiliano Prometeu ensina a que esgotemos o destino que nos coube. Até final, há nas gerações modernistas uma dor que ninguém apaga.

Texto publicado no Jornal do Centro, de 21 de Setembro de 2006.

4 comentários:

heresias consentidas disse...

ave azul 'inda vive
vai sair o nº 10

A revista "Ave Azul" está a preparar a sua edição nº 10.

Branquinho da Fonseca e Rodrigo Emílio serão as "estrelas".

Perguntámos a um dos responsáveis como é que a "coisa" anda e ele soltou um gemido: "anda a ritmo lento, vítima do desapoio e da erosão".

Não quero insistir na tecla de uma vida inteira, mas quando se atira para estados comatosos muito daquilo que de melhor temos por aí à mão... desculpem, mas tenho de concordar com os que dizem que o Quim Barreiros é que é bom para Viseu.

Um abraço de solidariedade para com todos os que teimam em não permitir o funeral da "Ave Azul" e a promessa de que em breve aqui melhor dela se falará.

hfm disse...

Um texto para reflectir. Obrigada, Martim.

Anónimo disse...

Fulgurantes associações. Grande abraço pela dádiva...

Su disse...

imensa essa dor ... sem tamanho

jocas maradas