2007-12-31
"A cultura do blogue nacional", por J. Pacheco Pereira
A CULTURA DE BLOGUE NACIONAL
Os blogues, a blogosfera, são um facto cultural novo nos últimos cinco anos. Não abunda assim tanto a novidade no domínio lato da cultura, para que possa passar despercebida, ou melhor, notada mas não percebida, ou erradamente percebida. Muita coisa nos blogues vem em continuidade do passado, existia noutros meios e sob outras formas, mas mesmo a que apenas fez a transmutação dos media clássicos para os blogues como media mudou também com o meio. Mudou e continua a mudar.
Existe por isso uma nova "cultura de blogue", com traços comuns com idênticas culturas da Rede urbi et orbi, mas também com traços nacionais próprios. Não é por se usar a mesma ferramenta de software que os americanos, brasileiros, japoneses e chineses que deixamos de ser portugueses, de levar para lá o nosso mundo exterior. Não somos ricos na Rede se somos pobres cá fora, não somos sofisticados em linha, se somos trogloditas cá fora, não sabemos mais e pensamos melhor nas páginas do Blogger do que pensamos cá fora, nos cafés de província, ou no Bairro Alto ou no Lux ou nas páginas dos jornais, não se é cosmopolita lá dentro se se é provinciano cá fora, não se é subserviente cá fora e independente no ecrã diante do computador, não se é burro cá fora e inteligente lá dentro.
O que se passa é que esse verdadeiro mostruário em linha, feito de mil egos à solta, revela mesmo a nossa pobreza, a nossa rudeza, a falta de independência face aos poderosos, grandes, pequenos e médios, os péssimos hábitos de pensar a falta de estudos e trabalho, de leitura e de "mundo", que caracterizam o nosso "Portugalinho". Nem podia ser de outra maneira. Com a diferença que nos blogues o retrato é mais brutal porque mais arrogante e mais solto, ou pelo anonimato, ou pela completa falta de noção de si próprio de quem, por poder escrever sem edição para os milhões de leitores potenciais da Rede, acha que é crítico de cinema instantâneo, engraçadista brilhante, analista político, escritor genial de aforismos, herói único da denúncia dos males do mundo, e portador de todas as soluções que só não são aplicadas porque os outros, a começar pelo blogue do lado e a acabar no fim do mundo, são todos corruptos, vendidos e tristes. Como os blogues são viveiros de elogios mútuos e de complacência, estes traços alastram como um vírus e tornam-se comunitários, definidores do meio. Mas, até porque nos dá um retrato único da mesquinhez da vida intelectual e cultural nacional, o lado do não dito, do não enunciado no Jornal de Letras, no Ipsilon, nas notícias culturais do Diário de Notícias e no contínuo que vai das novas colunas sociais disfarçadas de sociologia do presente e no jornalismo light até às revistas do jetset, a blogosfera é interessante e única.
Eça, se fosse hoje, poderia escrever sobre os blogues o que escreveu sobre os jornais:
"A tua ideia de fundar um jornal é daninha e execrável. (...) tu vais concorrer para que no teu tempo e na tua terra se aligeirem mais os juízos ligeiros, se exacerbe mais a vaidade, e se endureça mais a intolerância. Juízos ligeiros, vaidade, intolerância - eis três negros pecados sociais que, moralmente, matam uma sociedade! (...) Foi incontestavelmente a Imprensa que, com a sua maneira superficial, leviana e atabalhoada de tudo afirmar, de tudo julgar, mais enraizou no nosso tempo o funesto hábito dos juízos ligeiros. (...) É com impressões fluidas que formamos as nossas maciças conclusões. Para julgar em política o facto mais complexo, largamente nos contentamos com um boato, mal escutado a uma esquina, numa manhã de vento. Para apreciar em literatura o livro mais profundo, (...) apenas nos basta folhear aqui e além uma página (...) . Principalmente para condenar, a nossa ligeireza é fulminante. Com que soberana facilidade declaramos "Este é uma besta! Aquele é um maroto!" Para proclamar "É um génio!" ou "É um santo!" oferecemos uma resistência mais considerada (...) Assim passamos o nosso bendito dia a estampar rótulos definitivos no dorso dos homens e das coisas. Não há acção individual ou colectiva, personalidade ou obra humana, sobre que não estejamos prontos a promulgar rotundamente uma opinião bojuda."
Tudo isto é certeiro, mas, se ficássemos por aqui, não percebíamos a novidade, a mesma, aliás, que Eça defrontava com o papel crescente da imprensa. Mesmo assim, e até por isso, os blogues são coisa nova, são um fenómeno de per si. Trazem a quantidade, a lei dos grandes números, trazem as "massas". É verdade que apenas uma escassíssima minoria escreve blogues que caibam nesta categoria para além do puro confessional, e que apenas uma minoria os lê, mas nunca na história tanta gente se revela assim no espaço público, acompanhando mutações de geração e de hábitos culturais que vai no mesmo sentido de, por exemplo, a desvalorização da privacidade, do tempo lento, do silêncio, da palavra escrita em relação às imagens
Um dos rodriguinhos da escrita em Portugal é ter que sempre enunciar que há excepções. Há excepções? Claro que há, mas são mesmo excepções e não alteram a regra. A regra é esta. Eu estou a falar da regra.
É ainda cedo para medir o papel dos blogues em Portugal enquanto consumo cultural e mediático, como fonte quase única de conhecimentos "dinâmicos", envolventes, para as gerações que se estão a "educar" mais fora da escola do que dentro dela. Mas há indícios, principalmente nos mais jovens, do aparecimento de uma "cultura de blogue", de uma aproximação cultural ao mundo feita de pouco mais do que a leitura de blogues e de outras páginas da Rede, que têm mecanismos de social networking como as variantes nacionais do Facebook, ou o Hi5, o Second Life, e o mecanismo de trocas de "favoritos" que vai dar ao YouTube. Em Portugal, a absorção do mundo - política nacional, internacional, produtos culturais da moda, discursos e julgamentos, escolhas de podium e de agenda - pelos blogues difere da que se poderia obter através dos media tradicionais.
Para uma geração de jovens que só lê escassamente os jornais, para além dos desportivos e dos gratuitos, a "cultura de blogue" começa a deixar os seus traços próprios: redução da temática considerada "importante" ao que é discutido nos blogues, valorização do posicionamento comprometido, de "prós e contras", maior radicalismo político e opinativo, mecanismos de identidade grupais ou tribais, para além da absorção generalizada dos males que o Eça atribuía aos jornais: "juízos ligeiros, vaidade, intolerância", "impressões fluidas" e "maciças conclusões". Está longe de ser uma boa escola, mas é a escola, mais intolerante, mais a preto e branco, mais agressiva nas opiniões e menos ponderada, mas também mais democrática, no sentido em que envolve muito mais gente do que a que em qualquer altura teve sequer a veleidade de ter uma opinião, muito menos dá-la. Não é um fenómeno "mau" por si só, tem também aspectos "bons", na proporção desigual que é habitual para Portugal nestas coisas, mas caminha para ser um instrumento suplementar que reforça as duas tendências em curso nos nossos dias: a da substituição da democracia pela demagogia e a espectacularização da sociedade.
A blogosfera é tão avessa à crítica como os media tradicionais, com a agravante de que o envolvimento narcísico é tão forte que, mesmo dentro de blogues colectivos, a mais pequena fractura se torna explosiva. Os blogues não gostam de ser objecto de críticas e, como é obvio, tem uma alta noção de si próprios e estão tão cheios de autocomplacência e de elogios mútuos que consideram um anátema qualquer discurso que lhes pareça exterior e que os ponha em causa, a eles e às regras do jogo que estabeleceram. Desde o início da popularização da blogosfera o chamado "metabloguismo" era considerado um desvio da genuinidade do discurso em linha, mas, sem reflexão crítica sobre o próprio meio, sobre o meio em Portugal, que introduza critérios de qualidade e exigência que os blogues são lestos a exigir a outros mas não a aplicar a si próprios, os blogues serão apenas mais uma câmara de ressonância da pobreza da nossa vida cívica.
Como também tenho um blogue, deixo aos leitores o julgamento do que se me aplica do que aqui digo.
(versão do Público, 29 de Dezembro de 2007, recolhida em abrupto)
2007-12-30
2007-12-29
Dalila Rodrigues reactualiza vida e obra de Grão Vasco
«Grão Vasco é um dos maiores pintores portugueses e foi o primeiro a assinar o seus quadros», disse à Lusa Dalila Rodrigues.
«Lamentação aos pés de Cristo» foi a primeira tela assinada por Grão Vasco, «por volta de 1520».
«Vasco Fernandes, assim era o seu nome de baptismo, assinou exactamente VFRD. A segunda tela está assinada em latim, Velacq e destinava-se ao mosteiro de Santa Cruz de Coimbra», explicou a investigadora.
O álbum, profusamente ilustrado com obras do pintor viseense, «reactualiza a vida e obra de Grão Vasco, sendo uma proposta de percurso artístico, com uma abordagem sistemática da primeira à sua última obra», disse.
Uma das questões para as quais Dalila Rodrigues encontrou fundamento documental foi o nascimento de Vasco Fernandes numa casa junto a um moinho.
«Na realidade há documentos que vão ao encontro da tradição oral que referem isso mesmo. Há de facto documentos que falam do moinho do pintor», disse.
Para Dalila Rodrigues esta «é uma obra para um público interessado e não especializado, ainda que as comunidades científica e académica possam ver nele um instrumento de trabalho».
Segundo a autora, das 80 obras atribuídas a Grão Vasco «apenas cerca de 40 serão seguramente de sua autoria, havendo muitas que, sendo-lhe atribuídas, pertencem ao seu discípulo Gaspar Vaz». Dalila Rodrigues está aliás a preparar uma monografia sobre este pintor.
O álbum, editado pela Alêtheia, além da reprodução de telas do pintor como «S. Pedro», o Tríptico da Sé de Lamego ou o retábulo da de Viseu, é dividido em quatro partes: a biografia, documentos históricos e aura mítica que se desenvolveu à sua volta, o percurso artístico, as parcerias e as experiências individuais, e a quarta, sobre a oficina de Viseu.
Dalila Rodrigues investiga desde há muito a obra do pintor, tendo comissariado a sua primeira exposição no estrangeiro, em Salamanca, em 2002.
Antiga directora dos museus Grão Vasco e Nacional de Arte Antiga, é actualmente professora dos institutos Politécnico de Viseu e Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, e está a ultimar uma história da arte portuguesa que sairá em Abril.
Diário Digital / Lusa
20-12-2007 10:52:20
Vida e obra de Eça de Queirós em ciclo de conferências na Europa, Brasil e EUA
2007-12-28
2007-12-27
benazir
como ao terreiro as balas e o rei.
os cobardes são assim sem aviso
cruéis e bárbaros torpemente.
o inverno ao paço foi chamado
como o sol declinado pela pólvora.
um dia o negrume será arminho
como a neve sinal deste queixume.
2007-12-26
"Misérias domésticas", por António Barreto
A impunidade, a irresponsabilidade e o branqueamento parecem indispensáveis às obras e aos concursos públicos. Depois das glórias internacionais, chegou a vez das nacionais. Antes mesmo de acabar a presidência portuguesa, foram inauguradas as estações de metropolitano do Terreiro do Paço e de Santa Apolónia. Foi momento alto para a obra pública e para a vida do Governo. A luzidia comitiva fez o que tinha a fazer, accionou os sistemas, inaugurou e cumprimentou. Sócrates fez discurso. O melhoramento dos transportes que se anuncia é indiscutível. O conforto para os que fazem a trasfega todos os dias aumentou muito. Há décadas que estas obras deveriam estar feitas. A principal estação de caminho-de-ferro da capital não tinha metro, caso certamente único em metade do mundo, e a outra metade não tem metro! O mais importante ponto de passagem, durante décadas, entre as duas margens do Tejo não tinha ligação directa entre barcos, comboios, autocarros e metropolitano! Toda esta obra é discutível, pelo sítio, pela dimensão e pela solução adoptada. Com certeza. Mas os benefícios parecem, para já, inquestionáveis. Só que... A obra demorou dez anos a mais. E custou muitos milhões de euros a mais, pelo menos 140. A câmara e o Estado foram relapsos, as empresas construtoras não previram os graves acidentes ocorridos, nunca foram apuradas as responsabilidades pelos atrasos, pela imprevidência, pelos prejuízos e pelos custos exagerados. As inspecções não funcionaram, a fiscalização também não. Muito menos a justiça. A impunidade, a irresponsabilidade e o branqueamento parecem indispensáveis às obras e aos concursos públicos. Esta é apenas a última de uma longa e permanente série de obras públicas sem controlo nem planeamento. E, ao que parece, sem honestidade e rigor.
O julgamento da UGT e de mais de 30 dos seus dirigentes, entre os quais o antigo secretário- -geral Torres Couto, chegou ao fim. Com uma excepção (mas com crime prescrito), os arguidos foram todos absolvidos. Falta de provas. Acusações não fundamentadas. Ausência de documentação demonstrativa. Foram estas as conclusões do tribunal. Os factos alegados datam de 1990. O processo foi iniciado em 1995. Foram necessários 17 anos! Perderam-se vidas e carreiras. Não se fez justiça.
A ASAE decidiu responder aos seus críticos. Ou antes, o secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor publicou um comunicado no qual investe contra os críticos da actuação daquela polícia da segurança alimentar. É, a todos os títulos, um comunicado notabilíssimo. Muito daquilo que a ASAE e o Governo são acusados é totalmente confirmado por este comunicado, que é uma verdadeira obra-prima! Num estilo de grande burocrata despótico e num exercício de puro cinismo técnico e jurídico, garante que nada é proibido, "desde que...". Bolas-de-berlim na praia, castanhas assadas, facas de cozinha, colheres de pau, açorda de pão velho e produtos artesanais, tudo é permitido, "desde que...". No "desde que..." está a chave. Os produtores têm de estar certificados, as facas descontaminadas, as colheres higienizadas, as gorduras medidas, os aromas calibrados, as licenças actualizadas, os géneros embalados, os procedimentos normalizados, as torneiras automatizadas, as mãos desinfectadas, as temperaturas aferidas, os queijos datados, o fiambre etiquetado, a ventilação assegurada, os transportes refrigerados, as licenças regulamentadas, as certificações validadas, as inscrições conferidas, os funcionários identificados, os géneros protegidos, os produtos separados e os operadores licenciados. Desde que tudo isto seja feito e esteja assegurado, há bola-de-berlim e croquete.
Com este mês de Dezembro, iniciou-se mais uma campanha de promoção de Portugal no mundo. São dezenas de cartazes, de enormes dimensões, nas cidades portugueses e centenas de inserções em revistas e jornais do mundo inteiro. Portugal foi transformado na "West coast of Europe". As imagens reproduzem as caras dos portugueses de sucesso, Mourinho, Ronaldo, Mariza e outros. É a mais vistosa de todas as saloiices em que este Governo (e outros antes dele...) se empenhou. É um velho hábito dos países do Terceiro Mundo e de algumas ditaduras que consiste em comprar páginas de jornal e minutos de televisão para se promover. Escolhem-se umas personalidades com hipóteses de serem reconhecidas e tenta-se convencer os putativos clientes de que este país é todo assim, feito de belas paisagens e de pessoas excepcionais. O dinheiro que se gasta com isto é colossal, mas talvez nada de muito grave. Apesar de inútil. O que mais choca, além da capacidade de influência no Governo que as agências de publicidade assim exibem, é a atitude de quem encomenda estas campanhas. Quem assim procede está a dizer aos outros que o país, sem campanha, é desconhecido e ninguém dá conta dele. São justamente os países que têm pouco a oferecer, que nem pela sua mediocridade se distinguem, que não pesam nas balanças da fama e da reputação, que são destituídos de interesse especial e que se revelam razoavelmente simplórios e longínquos, que sentem a necessidade de se promover e de repetir a sua excelência, a paz, o sossego, a beleza e os tesouros escondidos. Quem assim age está plenamente convencido de que o seu país não vale grande coisa e de que tem de fazer estas campanhas. Os responsáveis julgam que tudo se compra com publicidade, mesmo ridícula. O resultado é o previsível. Quem vir os cartazes e seja capaz de reconhecer aquelas individualidades de excepção pensará imediatamente que o país não tem mais nada a oferecer e pretende, com as excepções, convencer os estrangeiros. Portugal não precisava desta campanha para nada. Para absolutamente nada! Talvez o Governo precise, mas o país não.
"Firmado Mac. Carteles de cine de Macario Gómez" na Brontë
Firmado Mac. Carteles de cine de Macario Gómez |
---|
Catálogo de la exposición de la Filmoteca Española que recoge una selección de la obra del gran cartelista español de cine. Se completa con originales para la imprenta y otros elementos publicitarios de películas. |
Edita Filmoteca Española 2006 Encuadernación en rústica 30x24 cm 160 páginas |
15.0 euros |
"Conto de Natal", por João César das Neves
"A Abelha e o Natal", por Marcia Frazão
Pão de Alecrim
Ingredientes: 1 colher de sopa de sal 1 colher de sopa de folhinhas (frescas) de alecrim 30 gramas de fermento fresco ou 2 colheres de sopa de fermento em pó cerca de 7 xícaras de farinha de trigo 2 1/2 xícaras de água 1 colher de sopa de manteiga amolecida 1 ovo ligeiramente amolecido 1 gema 1 colher de sopa de mel
Modo de Fazer: Numa tigela grande misture o sal, o alecrim, o fermento e 2 1/2 xícaras de farinha de trigo. Numa panela com capacidade para 2 litros, esquente a água e a manteiga em fogo baixo, até ficar bem quente. Adicione gradualmente os líquidos aos ingredientes secos, bata a mistura vigorosamente. Acrescente mais 3 1/2 xícaras de farinha e bata até obter uma massa macia e pegajosa. Coloque-a numa tigela e cubra; deixe crescer até dobrar de volume (uns 30 minutos). Abaixe a massa e transfira-a para uma superfície polvilhada e amasse até ficar lisa e elástica (leva uns 10 minutos). Como é difícil encontrar uma forma com o formato de abelha, sugiro transferir a massa para uma forma redonda (e pensar que a abelha deu uma engordada!), untada e enfarinhada e deixá-la crescer por uns 30 minutos. Antes de colocá-la no forno pincele com a gema batida com o mel e depois asse por 30 minutos. Ah, durante o processo, pense em coisas boas, criativas, doces como saúde, amor, trabalho, delicadeza, humanismo, ternura, compaixão... pois como já disse, o pão é mágico e a abelha; mais ainda!
"La vida judía en Sefarad"
La vida judía en Sefarad |
---|
Catálogo de la exposición celebrada con ocasión del V centenario de la expulsión de los judíos de España, decretada por los Reyes Católicos. Índice Estudios Judíos en España. José Luis Lacave La Inquisición y el problema de los conversos hasta 1492. Haim Beinart Los conversos hispanojudíos: integración social y controversias literarias en la España medieval. Moisés Orfali La prosa hispanohebrea. Fernando Díaz Esteban La creación poética de los judíos españoles. Angel Sáenz-Badillos Rasgos y figuras de la actividad científica de los hispanojudíos. David Romano Manuscritos iluminados hispanohebreos. Bezalel Narkiss Las sinagogas españolas en sus restos arqueológicos. Ana María López Alvarez y Santiago Palomero Aproximación a los fondos de judaica y de hebraica de la Biblioteca Nacional. Uriel Macías Kapón Catálogo I. Vida religiosa II. Situación jurídica III. Vida social IV. Producción intelectual V. Presión religiosa Apéndices Bibliografía. Uriel Macías Kapón Vocabulario. Jacob M. Hassan |
Edita Ministerio de Cultura 1992 Encuadernación en rústica 30x24 cm 334 páginas |
30.0 euros |
"Bolo não cresce se você não agradece", por Marcia Frazão
Marcia Frazão
obs: este texto foi extraído de meu livro "A Cozinha Mágica de Marcia Frazão", editado pela Ediouro. A receita do Bolo de Chocolate está lá.
2007-12-25
"Natal", por João César das Neves
Natal 20 | 12 | 2007 09.00H
É assim desde o princípio. A canseira que não foi para a Senhora, grávida de mais de oito meses, fazer centenas de quilómetros até Belém! A despesa da viagem, do nascimento, da ida para o Egipto! A trapalhada do recenseamento, da falta de acolhimento, do estábulo! Para não falar na confusão das visitas dos pastores, dos magos e, pior, dos soldados de Herodes. Acima de tudo, canseira, despesa e trapalhada estão mesmo no centro do mistério supremo que nos leva ainda hoje a celebrar o Natal. Porque o Deus sublime quis vir através dos céus nascer como um bebé. Porque o Senhor do universo dissipou toda a sua glória, escondendo-a naquele estábulo. Porque Ele sabia que os homens não o reconheceriam e iriam desprezá-lo e tentar matá-lo, até conseguirem.
O Natal só existe porque o Verbo de Deus quis suportar uma enorme canseira, despesa e trapalhada pela nossa salvação. Por isso hoje, quando corremos, gastamos e sofremos por causa do Natal, ao menos lembremo-nos do que Ele e sua Mãe correram, gastaram sofreram. Por nós. Participar no Natal é amar o próximo, mudar de vida, entrar no amor. Mas se não o fizermos, mesmo que não o queiramos fazer, ao menos participamos no Natal repetindo a canseira, despesa e trapalhada que foi desde o princípio. Feliz Natal!
João César das Neves
Desejos de Natal (Nuno Rebocho)
Desejos de Natal
J J J J J J FELIZ NATAL ! ! ! J J J J J J
Ao Carlos Almeida
2007-12-23
Desejos de Natal
Feliz NatalAo Mário J. Casa Nova Martins e a todos
Mário
AO MILAGRE DA NOITE
Aqui e agora, que noite canora,
que lúcida aurora, celeste coral!
Além, acolá (em Belém de Judá)
que estrela sonora,
abóbada fora,
designada não sei que estrada real?!
Que flauta aflora
o santo curral?
É d'ouro esta hora:
- É Noite de Natal!
Rodrigo Emílio
in, PEQUENO PRESÉPIO DE NATAL, p.159
Antília Editora
2007-12-22
"Auto-estrada: percurso de um homem livre", de Júlio Allen Vidal, na Poetria (Porto)
Caros clientes e amigos, pedimos a vossa especial ATENÇÃO:
Vai ser lançado em breve o livro de poemas "Auto-estrada: percurso de um
homem livre", de Júlio Alberto Allen Vidal. Nascido em 1955, oriundo de uma
família da alta burguesia, começou a escrever em 1970, fez vindimas em
França, foi pastor de cabras na Galiza, servente de trolha e de pedreiro em
Luanda, vendeu livros, electrodomésticos e enciclopédias, para sobreviver
ao flagelo da toxico-dependência e sem qualquer apoio da família.
O mais importante nesta poesia foi o que o seu autor conseguiu fazer com ela
a nível pessoal: escapar a um destino ainda mais trágico, salvar o corpo de
uma morte anunciada e o espírito de um abismo sem retorno.
O que sentimos neste livro é antes de mais uma grande e pura autenticidade.
Mas também reflecte a sua força interior com que, ao longo de uma vida
marcada por muitos desesperos e solidões, e apoiado por uma inabalável fé
divina, soube preservar valores fundamentais como a capacidade de perdoar, o
respeito pelo próximo e o repúdio por todas as injustiças.
Pouco importa que alguns não lhe chamem poesia, se o Júlio Alberto Allen
Vidal a interpretou como tal e sobretudo dela se serviu para resistir à
auto-destruição, à dor e ao sofrimento.
Tem mais de cinquenta livros na prateleira e é o seu primeiro livro editado.
É o sonho de uma vida que a editora "Literatura em movimento" ajudou
corajosamente a realizar e a quem o autor agradece por "não esperar pela
minha morte para lhe dar actualidade".
Tem uma tiragem de 1000 exemplares, 195 páginas e custa 20,00 € dos quais
3,00 revertem para o autor.
Os livros encontram-se na Livraria Poetria, e se pretenderem adquiri-lo
poderão fazer desde já a sua reserva por esta via. Também poderemos enviá-lo
à cobrança para o endereço que nos for indicado.
Aproveitamos para formular os nossos sinceros votos de um Natal cheio de
felicidade e poesia e que 2008 seja o ano da concretização de todos os
vossos sonhos e projectos.
POETRIA
2007-12-21
2007-12-20
"São Bernardo", com João César das Neves
Paróquia de Nossa Senhora do Carmo
e Centro Cultural de Lisboa Pedro Hispano
Os Grandes Santos
____________
Dia 20 de Dezembro, Quinta-feira, 21.30
São Bernardo
com
João César das Neves
No Salão Paroquial
(esquina da Av. Maria Helena Vieira da Silva com a R. Raul Mesnier du Ponsard)
Metro da "Quinta das Conchas"
Nestes dias antes do Natal conhecer este Santo é escolher a sua companhia para viver bem estes dias
:___________
Apressa-te, ó Virgem, em dar a tua resposta; responde sem demora ao Anjo, ou melhor, responde ao Senhor por meio do Anjo. Pronuncia uma palavra e recebe a Palavra; profere a tua palavra e concebe a Palavra de Deus; diz uma palavra passageira e abraça a Palavra eterna.
(Das Homilias em louvor da Virgem Mãe, Hom. 4,8-9: Opera omnia, Edit. Cisterc. 4, [1966], 53-54)
São Bernardo
Abade e doutor da Igreja, séc. XII
--
Padre Duarte da Cunha
Igreja de Nossa Senhora do Carmo
Av. Maria Helena Vieira da Silva 12 Ig
Sim! Amen! Aleluia! Vem Senhor Jesus
2007-12-19
de repente
e do fogo larvar só matéria purulenta
inundando o verde frasco a gaveta
afundada no fundo estômago. eis-te,
pouco mais que fungo pesando longe
fora do tempo como inexistência breve.
de repente nem de ti uma imagem
ou sopro injectado no fígado acossado.
2007-12-17
" A fraude - carta de Natal escolar", in "Público", de 16 de Dezembro de 2007
O ensino não vai bem e dele não se esperam melhorias. Dos resultados, o melhor é dizer que, se, em geral, não são francamente baixos, é porque são confeccionados. Um pequeno grão de uma longa fraude. A mentira é o sintoma do sistema. E começa na cúpula.
Para chegar a esta conclusão, não tomei muitas notas nem delineei a estrutura de qualquer tratado: constata-se. Todos o sabem, embora não esteja nos livros. O espectáculo, bem montado, vincula-nos (quando não nos premeia) a todos, professores, pais, alunos: celebramos, é certo, o mais infeliz dos papéis, que é o de bobos estultos.
Actualmente, um estabelecimento de ensino - em geral, público - é um lugar desconfortável. Os docentes, à falta de melhor, destilam fel; os alunos, feita a ressalva devida, são rudes; os auxiliares vivem o ingrato dilema de vigiar professores e ser desautorizados por alunos. E o caos só não escandaliza porque é tacitamente aceite. Ninguém leva a mão à boca de espanto, pois já ninguém estranha.
Acresce que domínios curriculares como Formação Cívica (a bem dizer, uma obrigação de família), Estudo Acompanhado (na verdade, um pressuposto do estudo, que é nem mais do que verificar uma matéria) ou Área de Projecto (entenda-se trabalhos em grupo sob mote), cujo sentido talvez fosse possível admitir numa fase inicial da escolaridade (e, ainda assim, diluídos nas disciplinas vigentes de 1.º Ciclo - ler, escrever e contar continuam a ser objectivos - e tanto faz que se leia competências - essenciais), não passam de folclore dessa farsa a que se convencionou chamar reorganização curricular e gestão flexível do currículo. Não será preciso ter dois dedos de testa para perceber que as turmas de 1.º, 2.º e 3.º ciclos do Ensino Básico não comportam mais de 15 alunos (número arbitrário, mas razoável, a atender ao perfil do modelo actual de aluno).
A destituição do poder a que os professores têm sido sujeitos gerou um paradigma comportamental profundamente enraizado nos discentes, a transcender a ética humana: banalização do estudo, privando-o de importância e solenidade; incumprimento de tarefas; transformação da aprendizagem em divertimento ou entretenimento fútil; infantilização; boicote do sistema de ensino; desvalorização do esforço e sacrifício; iliteracia; desregramento, desrespeito e imbecilidade.
Recordo duas gratas figuras a quem ouvi chamar algumas coisas pelos nomes: Marçal Grilo e Lobo Antunes. Este último, se bem me lembro, aconselhava a que se tratasse os alunos como cães (entenda-se a metáfora, sem precipitações). Não acredito num ensino em que um professor não tenha, muitas vezes, de ser austero, e um aluno, não raro, de ser espartano. Por isso me espanta que o que dimana do Ministério da Educação contrarie tudo isto: erradicação da importância da Filosofia, rasura da literatura, despenalização das faltas, elaboração de planos redentores (Plano de Recuperação, de Acompanhamento, da Matemática, etc.), criação de inúmeras fraldas pedagógicas, elaboração de exames manifestamente caricaturais, invenção de "aulas" substitutas, e tanto mais. Os fautores do ministério não são incompetentes: são, antes, irreais. E irracionais.
Na sua nefasta acção, ajudam o aluno a ser esmoler e a pedinchar notas, convencem os encarregados de Educação a reivindicar o irrazoável e a encarnar um largo espectro de qualidades diabólicas e boçais e obrigam os professores a capitular na sua missão - se é ainda possível imaginar que o ensino assim tenha sido alguma vez considerado.
Nem tudo é deste modo, mas muito do que sabemos é-o. Vemos, ouvimos e lemos: não podemos ignorar. Contudo, este silêncio é de ouro, e nem sequer os sindicatos perturbam as boas consciências (as greves de sexta sucedem-se como a expressão de um mundo sinistramente repetitivo). (...) Não nos rebelando contra o sistema - o que exigiria, no mínimo, uma paralisação de todos os sectores de ensino por tempo indeterminado -, só nos resta sermos as chocas da arena morna em que pactuamos. E a haver desculpa, só a de não darmos por nada.
Para coroar o fracasso deste modelo de ensino, a recente alteração no estatuto, que prevê a "titularidade" dos docentes, e a proposta de modificação na gestão, que antevê a figura do "director", têm um duplo imperativo: fazer dos professores galos de combate e amplificar a divisão no seio da docência. Nada mais hábil, vindo da parte da classe política, a quem só resta limpar as mãos, já lavadas por inúmeros Pilatos. O que se adivinha, contudo, não se revela muito animador para o futuro da Educação em Portugal.
A actual ministra, entretanto, balanceia-se entre uma rigorosa verve e uma logorreia falsa. Não é dela a culpa: muitos outros vieram antes e indicaram-lhe o caminho. Ela só teve de caminhar.
Nota - Ficou a jeito esta minha cabeça. Se ela rolasse, não seria sinal de ser incómoda. Seria antes a prova de que o Big Brother não é ficção literária.
António Jacinto Pascoal (professor)
Escola Secundária Fernando Assis Pacheco, Lisboa
2007-12-16
"Saramago - Eu-próprio, o Outro?" de Francisco Maciel Silveira
2007-12-14
2007-12-13
Representações de Portugal na Literatura Portuguesa (7 décadas de história)
“A imagem era um enigma que sorria”
(Fiama Hasse Pais Brandão, “Peregrinação e catábase”, in Obra Breve)
Recuperando os ecos do inframundo e a conexão com a ave da poesia, a editora Averno acaba de editar (Agosto de 2007) Novas Memórias de Ansiães, um pequeno e arrebatador objecto literário de A. M. Pires Cabral, Manuel de Freitas, Vítor Nogueira e Rui Pires Cabral, complementado com magníficas ilustrações de Luís Manuel Gaspar. Antes do texto, é uma desfilada de imagens que se desvela e uma história acontecida que mais ou menos assim se conta, por ter havido uma antiga vila de Ansiães, sede de concelho e com foral desde 1075, no alto de uma colina plantada, perto da aldeia de Lavadeira, que hoje lamenta, na frieza das suas ruínas, a perda da glória, depois de ter visto confirmado o estatuto de vila, por alvará de D. João V, datado de 6 de Abril de 1734, e assistido, já no século XIX, à deslocalização da sede concelhia de Ansiães para Carrazeda, abrindo-se o lugar a uma letárgica epidemia de silêncio que a literatura aborda poliedricamente, reflectindo na sua pluricodificação uma “informação” altamente concentrada e privilegiada, revelando-se, no caso, o vigor das “línguas literárias” como fundante “instrumento de cognição do homem, da sociedade e do mundo” (Aguiar e Silva). Acontece neste caso e em todas as lacerações.
Assim, o poema “No castelo de Ansiães” de A. M. Pires Cabral, ao defender que “a história não é uma serpente / que se refaz em cada primavera, / mas quando muito morde a própria cauda”, revela um velho Portugal “dissolvido no ácido dos dias” e escondido “por silvas e aveia brava”. Conformado e anticonformista, a um tempo, diz o Poeta que os horizontes “permanecem os mesmos” e, em fecho vital e actuante sobre o leitor, lança a interrogação que importa a respeito do país que temos: “porquê esta água insubmissa / que devagar me molha o reverso dos olhos?”
Em linha paralela segue Manuel de Freitas, em “Ruínas de Ansiães e Carrazeda”, resultando do cotejo poético uma importante conclusão medial:
Mas são esses – os de Carrazeda, a nova –
os túmulos vivos que nos restam:
cafés apinhados, lojas que se esqueceram de fechar,
a vasta e inacreditável quinquilharia que
faz da Papelaria Horizonte um exemplo de sucesso.
Penhores, dispersos, de algo que nunca existiu.
Um país, garantem-nos. Mas Ansiães, a velha,
nasceu antes da nacionalidade, embora
a tenha acompanhado o melhor que pôde.
Parecem demasiado perfeitas, estas ruínas,
demasiado diferentes daquela que será um dia
a nossa.
Inferidos os dois “diferentes” países, há um belo desencanto poético nisso, porque as “cidades, já se sabe, também morrem”, como, afinal, jaz um Portugal “enkitschado” e acedioso, longe mesmo da histórica perfeição inscrita nas ruínas.
Vítor Nogueira, no poema “Comércio tradicional”, festeja a posse da velha Ansiães, permitindo-se o óbvio translato metonímico de um Portugal desapossado, desesperadamente em queda: “A tarde / em que, lutando com abelhas, tomámos posse / do improvável Castelo de Ansiães.”
Por último, deixam-nos estas Novas Memórias de Ansiães com uma composição poética de Rui Pires Cabral, intitulada “Outro castelo”. Nela, o escritor expressa a dor da revisitação e espanta-se “que aquela beleza inteira / pudesse ter persistido / na sua alterada solidão”. Tal inquietação pela permanência e pela mesmidade dimana da desordem e do tumulto em que o sujeito caiu, longe que o meio o pôs da segurança pacificadora. Resta agora o “espectro de outro castelo / ao qual não é possível regressar.”
Em 2006, na contiguidade de uma poesia acontecendo “ao correr do tempo todo”, Fiama Hasse Pais Brandão, num dos vários inéditos apostos a Obra Breve, de título “Foz do Tejo, um País” e incluído na divisória “as Poéticas”, alude ao carácter marítimo de “um país que fala dentro da fronte, / olhando as naus, navios, barcos pesqueiros / e os trilhos das famintas aves pintoras”, criando no explicit poemático, em estrofe de fulminante beleza, uma das mais certeiras representações literárias de Portugal:
É uma nação única de memórias do mar,
que não responde senão em nós. Glórias, misérias,
que guardámos por detrás do olhar lírico
e da língua, a silabar dentro da boca.
Nunca chamámos o mar nem ele nos chama
mas está-nos no plano como estigma.
Como o afirma Gastão Cruz a Jorge Maffei, Rua de Portugal, obra do poeta algarvio publicada em 2002, é uma colectânea poética na qual o escritor tentou “encontrar uma espécie de disciplina realista”, tentando “fazer poemas sobre coisas, sobre lugares, coisas mais concretas, menos abstractas”. Aumentando avidamente o tempo, lendo os lábios “o texto acendido”, eis que “Já não existe a casa / vinte o / número / da trémula muralha térrea / defensora / duma pátria começando / quase sem luz”. Do ninho do poeta à pátria do artista é a mudança e a decepção pela fantástica perda que tomam o espaço biográfico individual e o fazem analogia de um país agónico, soçobrante.
Integrando realidades culturais e históricas planetárias através de incisões emocionais muito próprias, António Franco Alexandre, ao manifestar-se assim sem prioridade portuguesa, não descura tal situação, permitindo-se algumas “evidências” impressionantes, como a que acontece no poema 17 das “Terceiras Moradas”, um inédito de 1994, que viria a fazer parte de Poemas (1996): “somos um país pequeno, andamos / amarfanhados com a dimensão da boca, aonde não cabe / um peixe.” Já antes, em Oásis de 1992, deixara Franco Alexandre uma singularidade apreciativa sobre a sua terra, imagem do seu país: “para que a voz se deite no lençol e olhando // veja a pequena terra em que nasci / o sossego das grandes chuvas desabando no pátio e o respirar da casa / o rosto de minha mãe”.
Em 1982, faz publicar Mário Cláudio Terra Sigillata, livro poético fabuloso, com um poema de abertura, de título “Primeiras Escavações”, com uma alusão inicial ao país rural que é antológica imagem de um certo Portugal:
Um zumbido, este país te enlouquece.
Penetras pelos muros de pedra solta, atravessas a
aldeia de casas quase todas
brancas, uma só vermelha,
extensíssima.
As velhas apartam as espigas, com duas pombas a
seus pés. As mães fazem
tinir as agulhas da malha ra-
pidíssima. As crianças cor-
rem trigueiras e em gritos,
minúsculas bruxas.
Aliás, a breve admonição logo subsequente (“Descobrir esta terra, descrevê-la, será usar a cama de / novo”) mostra que as imagens irrompidas da forja criadora são iluminações sobre os “sinais da terra”. Escavando, o Poeta inscreve nestas “Primeiras Escavações” lápide não negligenciável sobre o Porto, um certo Porto com uma auréola de “camélias maceradas”, terno e espectral, pertença de uma “sigillata terra” decifrada pelo peso das “nossas rugas”.
Espantosamente perto da perfeição, também Al Berto (e recupero o atrás dito sobre Fiama), uns anos antes, em 1977, deixa no “atrium” de Á Procura do Vento num Jardim d’ Agosto uma interessante nota do dissídio íntimo vivenciado pelo sujeito poético associada a uma certa imagem do país construída por traço unitivo marítimo: “hoje abri novamente a janela onde sempre me debruço e escrevi: aqui está a imobilidade aquática do meu país, o oceânico abismo com cheiro a cidades por sonhar. Invade-me a vontade de permanecer aqui, para sempre, à janela, ou partir com as marés e jamais voltar…”. Sem euforia no caso, antes se notando o oposto, uma nota mais alarmada, desesperada mesmo, se colhe em Uma Existência de Papel, de 1985, facilmente se intuindo haver um país adverso para os poetas: “escuta / a partir de hoje abandono-te para sempre / ao silêncio de quem escreve versos / em Portugal / tens trinta e sete anos como Rimbaud / talvez seja tempo de começares a morrer”.
Eugénio de Andrade, ao publicar, em 1974, Escrita da Terra, trouxe para o palco da literatura uma colectânea poética onde pontuam inúmeros espaços de eleição do poeta, com claras ligações ao país espacejado – títulos como “Rua Duque de Palmela, 111”, “Monfortinho”, “Peniche” (“há só vento no meu país”), “Tavira 1944”, “Jardim de S. Lázaro”, “Castelo Branco”, “Cabedelo”, “Dunas de Fão”, “Foz do Douro”, “Sul”, “Povoa de Atalaia”, “Campos de Atalaia”, “Lisboa”, “Sesimbra”, “Arredores de Beja”, “Alentejo”, “Moledo do Minho”, “Amanhecer em Estremoz”, “Nordeste”, “Vale do Ceira”, “Fão”, “No Cemitério da Lapa”, “Os Girassóis do Alvor” e “Cacela” permitem uma construção subjectiva de Portugal e a leitura integral dos poemas, aqui desnecessária, faculta encontro com o país reflectido por um “olhar trabalhado pelo lume”. Ainda nesse mesmo ano, vem a lume Homenagens e Outros Epitáfios, livro em que Eugénio de Andrade celebra um conjunto de figuras gradas da cultura nacional e internacional. Não se exime aí o poeta, na composição “A Jorge de Sena, no chão da Califórnia”, a lançar curta e contundente seta sobre a pequenez moral do país, bem diferente da representação do Portugal simples de “A Pequena Pátria” de Os Lugares do Lume (1998): “Escreveste como o sangue canta: / de-ses-pe-ra-da-men-te, / e mostraste como não é fácil / neste país exíguo ser-se breve.” Quase duas décadas depois, em “Mulheres de Preto” de Rente ao Dizer (1992), fixará Eugénio de Andrade uma interessantíssima representação da mulher rural portuguesa, que é ainda claro emblema de um certo país resistente e empírico:
Há muito que são velhas, vestidas
de preto até à alma.
Contra o muro
defendem-se do sol de pedra;
ao lume
furtam-se ao frio do mundo.
Ainda têm nome? Ninguém
pergunta, ninguém responde.
A língua, pedra também.
Acresce ainda que Eugénio de Andrade é um dos mais laboriosos conformadores da canónica representação literária do país ao elaborar competentes antologias sobre espaços territoriais assinalados. Lembrem-se, por exemplo, títulos como Daqui Houve Nome Portugal (1968), Memórias de Alegria (1971), Alentejo não tem Sombra (1982) A Cidade de Garrett (1993) ou Alentejo (1993).
Ruy Belo, em Boca Bilingue (1966), inicia a titulação “Portugal Sacroprofano”, que se continua em Homem de Palavra[s] (1970), permitindo-nos representações do Mercado dos Santos, em Nisa, e de Vila do Conde, por exemplo, bem como importantes confidências poéticas sobre a percepção do tempo (“O tempo é outro tempo nas terras pequenas / e quem de si mesmo afinal foge encontra aqui o coração em festa”) e directas denúncias sobre o estado da nação (“Neste país sem olhos e sem boca // Neste país do espaço raso do silêncio e solidão / solidão da vidraça solidão da chuva” e “O lugar onde o coração se esconde”). Esperançado, no entanto, projecta-se o poeta para o futuro, em “O Portugal futuro”, dizendo o sujeito poético que “O Portugal futuro é um país / aonde o puro pássaro é possível”. Ou então, em exílio produtivo, pode o escritor, como o vai dizendo em País Possível (1973), fugir ao desgaste do país castrador através do arejamento espacial (“Enche-se o peito de ar noutros países / onde fora de nós em nós buscamos Portugal / longe do desgastante dia-a-dia português”), não denegando mesmo um certo e gratulatório desenraizamento longe da Heimat, até porque o poeta assume em “Peregrino e hóspede sobre a terra”: “Meu único país é sempre onde estou bem // Sou donde estou e só sou português / por ter em portugal olhado a luz pela primeira vez”. Mais tarde, em Toda a Terra (1976), exclamará um desalentado poeta: “Aqui neste país nesta rosa divina que me elimina pétala a pétala / ninguém já me julga eu já sou somente quem fui / e sou este país onde eu era já antes mesmo de ser”.
Há, na mesma década de 60 do século XX, uma Feira Cabisbaixa (1965) de Alexandre O’Neill que é não apenas um grande conseguimento poético como é, em simultâneo, um objecto artístico denunciante e multímodo de imagens e sugestões sobre o Portugal de então. Mas, pensando melhor, esta “feira cabisbaixa” não cessa de acabar. Poemas como “Portugal” (“Ó Portugal, se fosses só três sílabas, / linda vista para o mar, // se fosses só o sal, o sol, o sul, // Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo, / golpe até ao osso, fome sem entretém, / perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes, / rocim engraxado, / feira cabisbaixa, / meu remorso, / meu remorso de todos nós”), “O País Relativo” (“País por conhecer, por escrever, por ler… // País do cibinho mastigado / devagarinho. // País amador do rapapé, / do meter butes e do parlapié, / que se espaneja, cobertas as miúdas, / e as desleixa quando já ventrudas. // País pobrete e nada alegrete, baú fechado com um aloquete”) ou “Made in Portugal” (“Peixe sem solução, / máquina a parar, / circular e vítrea aflição / a olhar.”) são criações que riem, “num Portugal a entristecer que era o do Estado Novo”, como o diz Maria Antónia Oliveira.
Um pouco antes, o mesmo O’ Neill, por 1958, no livro No Reino da Dinamarca, já se despedira da pátria no poema “Um Adeus Português”, vituperando a falta de futuro e o incrível pântano que era o país: “à roda a que apodreço / apodrecemos / a esta pata ensanguentada que vacila / quase medita / e avança mugindo pelo túnel / de uma velha dor // esta roda de náusea em que giramos / até à idiotia / esta pequena morte / e o seu minucioso e porco ritual / esta nossa razão absurda de ser”.
Voltando a 1965, lembre-se a reconhecida Praça da Canção de Manuel Alegre, onde se colhem, por exemplo, uns “ventos tristes” e um “país amado”, bem como o desânimo pelo não achamento do país (“só mau país não achei”). Um outro poema do mesmo livro, “País de Abril”, permite mesmo uma representação de um país devastado e cinzento: “ – minha pátria vestida de viúva / entre as grades e a chuva das cidades”, “- minha pátria perfil de mágoas e tabernas”, “- minha pátria bordada de farrapos / capa de trapos remendada a verdes folhas”, “- minha pátria a rir como quem chora / (A festa da tristeza é tudo o que lhe resta)”… Um pouco à frente, o poeta falará de “uma pátria parada / à beira de um rio triste”. Em O Canto e as Armas, de 1967, Alegre mostrará ainda um país triste (“Minha pátria sem nada / sem nada / despejada nas ruas de Paris”), um “país de lágrimas e aldeias”, “pátria sem pão / de país em país”. Definindo poeticamente o país no poema “Portugal”, em Chegar Aqui de 1984, Manuel Alegre, sem atingir possivelmente a fulgurância de Fiama e Al Berto, dá uma imagem afim ao dizer: “O teu destino é nunca haver chegada / O teu destino é outra índia e outro mar / E a nova nau lusíada apontada / A um país que só há no verbo achar”.
É o artefacto literário um específico objecto que, fundindo em si, para lá da óbvia dimensão estética, vertentes socioculturais e históricas, facilmente dissemina ilusões e imagens que se constituem em detalhes importantes, de acordo com a subjectividade criativa. É um esquecidíssimo José de Esaguy, nos seus Versos de 1953, quem vem a manifestar, em reacção amorosa e referindo-se à nossa capital, um dos lugares desalentados mais fulgurantes da literatura portuguesa da segunda metade do século XX: “Lisboa / … / Já não me atrai / E não me chama”.
Em 1947, publica a Seara Nova o título Ossadas de Afonso Duarte, aí se recolhendo poemas publicadas em revistas entre as décadas de 20 e de 40 do século XX. E é precisamente do poema “Estepa”, que se levanta um grito, dentro de uma tópica desolada que percorre muitas das imagens do país criadas pelos autores portugueses, que diz: “Desterro dos desterrados, / Meu coração é estepa delicada: / E meu cabelo neva / Sem Pátria, minha amada, / Minha Amada.” Adensando mesmo este desolamento, a “Canção da Vida” esclarece “Ah, meu eterno Portugal, meu peito, / Esta é a dor, sim a dor, de que sou feito.”, para logo à frente surgir, em tirada final, um questionamento directo ao coração: “Toda a minha mensagem, Pátria, foi contigo! / E, na terra da Pátria, sem vislumbre de erro, / Onde está, pergunto, o ancoradouro, / O meu porto de abrigo?” Resta ao Poeta uma outra via mais simbólica, que é, como acontece em “Epigrama”, identificar-se com o mar: “Há só mar no meu País. / Não há terra que dê pão: // Há só mar no meu País: / E é ele quem diz, / É ele quem sou.”
Os dez livros de poesia do “Novo Cancioneiro”, publicados entre 1940 e 1944, fornecem fulgurantes retratos de um país sofredor e estéril: lembro o poema 21 de Terra (1941) de Fernando Namora (“António, é preciso partir! / o moleiro não fia, / a terra é estéril, / a arca vazia, / o gado minga e se fina! (…) Árida, árida a vida! / António, é preciso partir! / António partiu. / E em casa, ficou tudo medonho, desamparado, vazio.”); lembro um trecho de um dos “Poemas do Cão Danado” dos Poemas (1941) de Mário Dionísio (“Eis-nos boiando, aflitos, / só as narinas e os braços fora de água, / prestes a sucumbir”); e lembro, por último, pequena parte do “Poema do Dóri” de Os Poemas de Álvaro Feijó ( “Neste país de luz e Sol, / o nevoeiro anda cá dentro / e não nos deixa olhar…”).
Não deixa de ser interessante notar que o último texto da derradeira presença, de Fevereiro de 1940, encerre a magnífica publicação com uma polémica entre Manuel Anselmo e Adolfo Casais Monteiro, afinal, acabadas imagens de diferentes representações do país digladiando-se.
“Uma poucas de palavras”, como diria Tomaz de Figueiredo, para dizer que esta abordagem é apenas seminal: de fora fica a poesia combatente de Rodrigo Emílio (“Era este um lugar / de raiz duradoura. / Mas soou a hora / de deitar país / fora…”), a poética reconfigurativa do país de José Valle de Figueiredo (“Portugal é grande, / (…) Cai, co´a alma dorida, / mas cresce e avança, sentida, / a perdida esperança.”) e toda a fecunda prosa portuguesa, não fosse eu aqui lembrar a construção de um país racista por alguns tresleitores de Vergílio Ferreira (bem como de uma pátria submersa), o país gregário de José Saramago ou o fim da utopia revolucionária político-social e a instauração da antiutopia, caracterizada pelo "desencantamento do mundo e pela desrazão", no Esplendor de Portugal de António Lobo Antunes.
Em artigo publicado na revista Ultramar, em 1941, sob o título “Uma mitologia portuguesa”, Pedro de Moura e Sá, ao referir-se mais à literatura do passado, conclui: “O homem buscou sempre nos livros uma representação, digamos, mitológica da vida, e era como criadora de mitos que a literatura atingia maior grandeza. Dos homens extraía-se qualquer coisa de essencial, que dava aos heróis dos livros um aspecto característico e exemplar.”
Poderemos nós, décadas volvidas, desejar outro tempo e melhor lugar?
(Variações, poucas, sobre a comunicação apresentada às "10ªs Jornadas Históricas de Seia" de Novembro último)