OS LIVROS DE 2013: Herberto Helder, Lisboa,
Assírio & Alvim, 2013 (maio).
Inconcluso e decetivo
relativamente ao que é uma cabeça, como o diz o paratexto inicial, é toda uma
cerebralidade memorial que logo ascende na «prosa» inicial (pp. 9-18) – é um
tempo devastado, fundo, mineral e zoológico que povoa a meninice e o adolescer
lá longe, é até um eco brandoniano que se despega fulgurante do fundo da
primeira página: «Uma noite acordei com o som dos meus próprios gritos» (p. 9).
Orgânicas, febris, pérfidas, perversas, quentes, na cabeça todas as imagens
devinham mágicas e ácidas, como um antiquíssimo bestiário maligno e redentor.
Não falta aí sequer o rito vergiliano do espanto especular. Desde aí, uma
espessa cicatriz de liberdade e de insujeição não mais deixará o poeta.
A poesia diz-se herbertianamente «nunca uma
chegada seja ao que for» (p. 12) e uma difusão dos chamados «ganhos fundamentais».
Devorante, sem mundo material, eis a limpidez da gramaticalidade.
Observando-se, o Poeta interroga
as suas servidões («dos trabalhos do mundo corrompida / que servidões carrega a
minha vida» [p.19]), os caminhos da desmemória e um à frente suspenso: « e eu
esteja atrás vivendo desse próprio esquecimento, / a mão cortada, cortado o
nome, além da morte escrita, / pelo buraco da voz o nome escoado para sempre»
(p. 117).
Fulgurante, em história poética
fulgurantíssima, como não ficarmos presos por estas Servidões de Herberto Helder?
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