É uma alegria ler aquela crónica de
título «Pascoaes e o idioma» e mais se ficar a admirar João de Araújo Correia e
Teixeira de Pascoaes, assim «pequenino, leveiro, afectuoso» (p. 64). De
conversa funda e variada, Pascoaes não esquecia nunca a fundante Língua
Portuguesa. Assim discorre, a propósito, Araújo Correia:
«Disse, de reformas ortográficas, o que
Mafoma não terá dito do toucinho – se acreditarmos em escrevedores de polpa no
capítulo Mafoma.»
Corroborando Pascoaes, o autor de Cartas
da Montanha (1955) adianta ainda:
«Dei razão a Teixeira de Pascoaes,
cismando entre mim que as reformas ortográficas impõem a escritores pensantes (…)
muito disparate. Misturam, no mesmo tacho, o assimilável e o indigesto. Se não
houver cautela, desarranjam a máquina de quem é são e escorreito.»
E segue a crónica, que transcrevo, com
as palavras de Pascoaes:
« - Quem ofende a Língua ofende-me a
mim. A Língua é a minha dama. Se não fosse a Língua, que seria eu? Se não fosse
a Língua, eu não seria nada…
Meditem-se estas palavras simples de
Teixeira de Pascoaes. Meditem-nas os meus amigos, aqueles que choram o tempo e
o latim que às vezes gasto, defendendo o Idioma. Considerem o que sou, pouco ou
muito, mas admitam que eu não seria nada se não fosse o Idioma. Deixem-me ser
grato a um credor que nunca me incomodou. Para lhe pagar juros de juros, merece
que eu o sirva, sem remuneração, até o fim da vida.
Se há mal nisto…
A Língua Portuguesa, pela maneira como
aí se fala e se escreve, é a meus olhos uma cidade maravilhosa desconjuntada
pelo furor dum terramoto. Por entre escombros, espreitam mármores divinos. Cumpre
a todo escritor desenterrá-los.
Abril – 1953. [João
de Araújo Correia, Cartas da Montanha, Régua, Imprensa do Douro, 1955, pp.
66-67]
Mas
quem quer mal aos mármores divinos?
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