2013-12-26

João de Araújo Correia, Pascoaes e a língua


É uma alegria ler aquela crónica de título «Pascoaes e o idioma» e mais se ficar a admirar João de Araújo Correia e Teixeira de Pascoaes, assim «pequenino, leveiro, afectuoso» (p. 64). De conversa funda e variada, Pascoaes não esquecia nunca a fundante Língua Portuguesa. Assim discorre, a propósito, Araújo Correia:
«Disse, de reformas ortográficas, o que Mafoma não terá dito do toucinho – se acreditarmos em escrevedores de polpa no capítulo Mafoma.»
Corroborando Pascoaes, o autor de Cartas da Montanha (1955) adianta ainda:
«Dei razão a Teixeira de Pascoaes, cismando entre mim que as reformas ortográficas impõem a escritores pensantes (…) muito disparate. Misturam, no mesmo tacho, o assimilável e o indigesto. Se não houver cautela, desarranjam a máquina de quem é são e escorreito.»
E segue a crónica, que transcrevo, com as palavras de Pascoaes:
« - Quem ofende a Língua ofende-me a mim. A Língua é a minha dama. Se não fosse a Língua, que seria eu? Se não fosse a Língua, eu não seria nada…
Meditem-se estas palavras simples de Teixeira de Pascoaes. Meditem-nas os meus amigos, aqueles que choram o tempo e o latim que às vezes gasto, defendendo o Idioma. Considerem o que sou, pouco ou muito, mas admitam que eu não seria nada se não fosse o Idioma. Deixem-me ser grato a um credor que nunca me incomodou. Para lhe pagar juros de juros, merece que eu o sirva, sem remuneração, até o fim da vida.
Se há mal nisto…
A Língua Portuguesa, pela maneira como aí se fala e se escreve, é a meus olhos uma cidade maravilhosa desconjuntada pelo furor dum terramoto. Por entre escombros, espreitam mármores divinos. Cumpre a todo escritor desenterrá-los.
     Abril – 1953. [João de Araújo Correia, Cartas da Montanha, Régua, Imprensa do Douro, 1955, pp. 66-67]  


Mas quem quer mal aos mármores divinos?

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