vem do desprezo o olhar que não vê. frio, glacial, o sangue enrijece- -lhe a pose. vindo à idade adulta, nada se sabe, nem eco. vindo o inverno, um dia, quando se olhar em vulgar charco, contra breve chuvisco, verá um rosto que o secará. aí, rasteiro gnomo tomar-lhe-á o corpo, privando-o da linfa. aí, nascerá um cacto azul mais belo do que um nenúfar. em cada verão, então, brotará do solo um líquido sanguíneo que irromperá dentro de ti...
2005-10-30
Adivinha de Tirésias
vem do desprezo o olhar que não vê. frio, glacial, o sangue enrijece- -lhe a pose. vindo à idade adulta, nada se sabe, nem eco. vindo o inverno, um dia, quando se olhar em vulgar charco, contra breve chuvisco, verá um rosto que o secará. aí, rasteiro gnomo tomar-lhe-á o corpo, privando-o da linfa. aí, nascerá um cacto azul mais belo do que um nenúfar. em cada verão, então, brotará do solo um líquido sanguíneo que irromperá dentro de ti...
proposta quase inicial de ave azul
Junto a Vergílio, o dia nasceu. ainda breve, quase nada faltou. nem desânimo. esta é a capa das costas do número 1 anunciando a incrível literatura. tomados de espanto, o tempo passa e a memória é mais longa. um dia, não será assim. então, colhe este sinal mudo no espaço íntimo de ti e abandona-te ao inverno que te confunde.
2005-10-29
a mesma ideia: FIDELIDADE OU LEALDADE
"Os grous são tão fiéis e leais ao seu rei que à noite, quando ele dorme, percorrem o prado para vigiar à distância; outros ficam ao pé dele, com uma pedra na pata para que se o sono os vencesse a pedra caísse fazendo tal ruído que os acordaria. Outros dormem todos juntos em volta do rei e fazem-no todas as noites em turnos para que nunca faltem ao seu rei." [H, 9 r]
2005-10-28
tesouras & alicates
é com a língua que corto o vento. a força dos alicates esmaga-me os ossos. novo e cego narciso, é com o corpo que dedilho os elementos. o lume desce à garganta e o mito ilumina-se nas paredes do estômago. na mala levo comigo os poemas dos outros. no espelho da água fito a imagem. a primeira, vinda sobre a pele dos dias. cada avanço é um som opaco, sem pegada. em ti me perco, já sem regresso. as lâminas da tesoura tombam e nem sequer um pouco da morte.
2005-10-26
cicatrizes
eis as cicatrizes do corpo da cidade. perto da memória, nem só fungos. há o gelo dos charcos e o fumo do esquecimento. quantas vozes e ecos debaixo das velhas tílias? perdeu-se um lenço desde a velha casa. nascendo o dia, ouve-se ainda o bulício da praça. o mundo envelheceu face à limpidez da imagem. e, no entanto, as formigas negras cresceram, incómodas. duas mulheres pisam o hálito quente da terra. uma festa, longínqua, declina. na velha estação, ao fundo do corpo, a chuva irrompe pela madrugada, queimando os dedos e as veias. o despertador acorda no espelho matando a alegria da revelação. dentro de mim, o comboio mata a cidade.
2005-10-25
2005-10-24
Navarrianas
a maligna voz do descontentamento,
vendo Gomes increpando o ser vulgar.
Que podia agora ela face aos tormentos,
que não fosse sua demissão logo exarar
e, debitando débeis uns lamentos,
logo correr para florido outeiro,
sempre fugindo à frente do Monteiro!
espantosa Christina Rossetti
2005-10-23
2005-10-22
OUTUBRO VEM...
Outubro...
Ó ar de desfalecimento,
és uma lírica suspensa à volta!
A voz do vento,
triste, cansada, em tom cansado e lento,
não sei que frases de rimance solta.
António Sardinha, A Epopeia da Planície
rapsódia de outubro
2005-10-21
REAL! REAL!
A EL-REY
De capa e volta, de calção e vara,
hei-de ir, Procurador do meu Concelho,
falar ao Senhor-Rey com fala clara,
dizer-lhe uma oratória que aparelho!
António Sardinha, A Epopeia da Planície.
CHOVE EM VISEU
2005-10-20
AVE AZUL - nº 1 - Outono de 1999
canto luminoso
porque marginal, da margem sombria da sabedoria, releio "canto desabitado" de António Gil sob a luz da euforia:
"refaço-a a partir do vago compasso da ventania, do estalar da vaga, do solo ressumando a litania dos dias já completos..."
António Gil, Canto desabitado
2005-10-19
2005-10-18
DA INTENÇÃO
2005-10-17
o mito de Narciso
2005-10-16
2005-10-15
DEFINITIVAMENTE, JOEY
2005-10-14
ÁRDUA POESIA
2005-10-13
2005-10-12
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