Uma história inesquecível: Augusto Ferreira
Gomes e Aquilino Ribeiro
Tocando-se, influenciando-se ou
dando-se à amizade e camaradagem, as pessoas comunicam e são sutura. Há
histórias de atores fluviais do tempo que, de deslembradas, permanecem esquecidas,
adormecidas. Talvez não haja outro escritor português assim, como Aquilino,
imerso em bordões e epítetos nada significativos, porque os apodos vulgares são
mesmo isso, vulgares e insignificantes.
Sem espoletar que não seja em
afloramento a classificação regionalista ou a tal impresença da digladiação
modernista, lembro, ao correr da pena, que em matéria aquiliniana não há
grilhetas, barreiras ou muros – pelo contrário, nele, bloco criativo multímodo,
radica o fogo criativo da descoberta e do risco.
Vem este arrazoado a propósito do
livro No claro-escuro das profecias
(Lisboa, Portugália Editora, s.d. [1941].), de Augusto Ferreira Gomes, com a
dedicatória alta “À memória do astrólogo Fernando Pessoa”. Ferreira Gomes foi,
a partir da morte de Mário de Sá-Carneiro, o principal amigo de Pessoa (Bréchon
di-lo “o melhor amigo de Pessoa”, p. 570.) e, como o defende o mesmo Robert
Bréchon, o seu guia da astrologia (Robert Bréchon, Estranho estrangeiro. Uma biografia de Fernando Pessoa, Lisboa,
Círculo de Leitores, 1997, p. 315.).
E é já meio do livro que se dá o
encontro de dádiva, de parceria, entre Ferreira Gomes e Aquilino – a fim de
provar que a gravura do século XVII não é, como Fontbrune defendia, Paris,
sendo antes, como o comprovaria uma gravura do século seguinte, Londres. O nó,
que á laço também, surge na nota da p. 89: “A gravura de Londres do século
XVIII foi-nos cedida pelo escritor Aquilino Ribeiro e já serviu para a capa do
seu livro O Cavaleiro de Oliveira.”
Mas deixemos o incêndio de Londres, que Ferreira Gomes vê em edição holandesa
de 1668 das Profecias de Nostradamus,
e perguntemos apenas – estará nisto uma sugestão de Aquilino?
Mar vasto é a obra de Aquilino, que
todos os dias se adenda e complementa – não cessem trabalhos, nem dias.
Viseu, 3 de abril de 2017
Martim de Gouveia e Sousa
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