LIMIARES DA ESCRITA:
Rodrigo Emílio, que amor não tarda – As lágrimas ancoradas à sombra do amor (1964)
Atrás da singularidade expressiva, e tal propensão
era fortemente buscada, irredutível até, não abandona Rodrigo de Mello, Filho
(que o pai era também alguém nas letras), depois Rodrigo Emílio, desde estas
primícias, a condição dupla de esteta e de interventor sociopolítico permeado
por uma axiologia de consanguinidade e de ideologema.
Não espanta, pois, o passo larvar inscrito nos
paratextos: trata-se de um livro escrito no sangue, dedicado ao pai e ao seu
exemplo de Mártir, de Mestre e de Guia, que lhe ensinara a ver na Poesia a
redenção da Vida, bem como, e principalmente, a João de Castro Osório, Mestre,
Amigo e Guia, e «à trágica genialidade da sua escrita». Havia este «ciclo
lírico», como se anuncia parenteticamente em subtítulo, ganho o «Prémio de
Poesia» de 1963 do «Concurso de Manuscritos» do S.N.I..
Identificando as lágrimas com poemas no que estes
têm de hipertrofia do sentir (passim)
abre-se o macrotexto com um intensíssimo poema de semas próximos da disforia e
do insulamento – assim as palavras da confidência poética trazem a morte, o
apodrecimento, a amputação e o isolamento onde o choro equivale a «incêndios de
água» onde o sujeito lírico destrói a dor. E, no entanto, a composição colaça
logo recoloca o tónus poético em ambiência de persistente amor: «Hei de, ainda,
andar e andar / E, ao passar no FIM, / Não darei pelo FIM!...» (p. 17).
Amiúde comovente, este livro de um Rodrigo Emílio
nascente contém poemas geniais de contenção, de central enérgica, de
poeticidade. Transcrevo, por exemplo, «A asa e a raiz» (p. 20), dedicado ao
também importantíssimo poeta José Valle de Figueiredo ( e com que precisão
Valle de Figueiredo aqui encaixa!):
Só
em Poemas se diz
Porque
a Poesia o abrasa
E
a sua alma é uma fonte secreta…
(Raiz
Com
instantes de Asa,
-
O Poeta!)
Derrame sentimental,
incontinência verbal emotiva, contenção enérgica, eis algum do travejamento
onde participa também um inegável horacianismo. Estoicismo, epicurismo,
ataraxia, moral greco-latina, eis algumas outras particularidades que se
desprendem de «Desterro azul» (p. 29):
Não
falemos. Ouçamos
O
silêncio de todo este azul
Que
nos envolve. Bebamos
Todo
este ouro solar que nos dissolve
E
nos bronzeia. Escutemos
As
gargalhadas do mar
A
brincar com a areia. E brinquemos
Também.
Mas sem falar.
Olhando estas ruas da cidade de Viseu, que Rodrigo
Emílio tão bem conheceu e calcorreou, é este o silêncio que ouço, que ouço
sempre.
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