Em direcção ao mar corre o sopro da vontade neste tempo bem estival. Leve como quem tudo abandonou, o pensamento de Al Berto assoma dizendo “sabe que o homem não foi feito para ficar quieto.”
Estou em Sines, na dobragem para a música do Sudoeste, e não esqueço o Poeta, que, aliás, veio ter comigo à esquina do bar mais conhecido dentro da noite espessa.
Falou-se da vida e do tempo em abismo. E dos corpos azulíneos e aéreos. Mas foi da alma do Poeta que mais se disse: da sua força individual e da capacidade do grito univocal em perturbar o “canto do homem”.
Noto que Al Berto se escreve ainda em Sines, aí revelando os ossos mais antigos e as velhas palavras forjadas na limpidez do mar. Desgastados e trabalhados, os renovados e raros vocábulos alcançam com esforço o último e definitivo silêncio. Não mais pede o desejo. E, no entanto, de si e da conexa textologia, subsiste sempre uma dor afiada encostada ao corpo e trazida por esse mar e pela febre do tempo.
Noite adiante, a língua fisiológica e codificada desliza no peito, desassossegada. A ferida do zinabre acerta o sofrimento e a pulsão, espalhando a irisação pela lepra do corpo que outro(s) abraça(m).
Como, afinal, impedir o gesto de ave sobre o papel ou o bailado de chamas dentro do cárcere corpóreo? A resposta, despicienda, escreve-se e inscreve-se na raiz das ondas e no claro entendimento de todos os iniciados.
Dos campos de sarças rola sempre um melancólico e sedutor olhar que é português e universal. Do consistente aproveitamento de referências e de motivemas resulta, ultrapassada a “maldição das vozes”, um clamor ostensivamente nómada e solitário. Como diz Cioran, “somos o tempo”; e é ainda do fundo de tempo que se levantam as imprecações al bertianas que convocam as horas, as memórias e os dias: “que horas serão dentro do meu corpo?”.
Al Berto cruza o tempo e os seus Mestres, de tudo se alimentando sem pressa. Com Baudelaire traz a cidade à poesia, com uma outra voz e um diferente medo. “acumulei infindáveis cadernos escritos; era esta a única maneira de remediar o medo”, ouço. Vinda dos litorais desaparecidos, esta é uma voz próxima e distanciada do mar. Dialógica e irrepetível.
Olho por dentro o Poeta e a “noite dos espelhos” (Manuel de Freitas) na minha recordação. “na cal viva da memória dorme o corpo.” Revela-se então a peste, vinda do fundo. E o medo amargo.
Encostado ao palco tmn do sudoeste, “quase luz nenhuma” – recordo. Liam Gallagher sobe ao palco e traz a serpente da música. “don’t believe the truth” encosta-se agora ao “ácido das noites em sépia”. Os Oasis são agora os peixes da madrugada “à procura do silente lume das cassiopeias”. Al Berto ainda na humidade do sonho. E os acordes de “Live Forever”.
Finalmente, o fogo sobre o mar.
Estou em Sines, na dobragem para a música do Sudoeste, e não esqueço o Poeta, que, aliás, veio ter comigo à esquina do bar mais conhecido dentro da noite espessa.
Falou-se da vida e do tempo em abismo. E dos corpos azulíneos e aéreos. Mas foi da alma do Poeta que mais se disse: da sua força individual e da capacidade do grito univocal em perturbar o “canto do homem”.
Noto que Al Berto se escreve ainda em Sines, aí revelando os ossos mais antigos e as velhas palavras forjadas na limpidez do mar. Desgastados e trabalhados, os renovados e raros vocábulos alcançam com esforço o último e definitivo silêncio. Não mais pede o desejo. E, no entanto, de si e da conexa textologia, subsiste sempre uma dor afiada encostada ao corpo e trazida por esse mar e pela febre do tempo.
Noite adiante, a língua fisiológica e codificada desliza no peito, desassossegada. A ferida do zinabre acerta o sofrimento e a pulsão, espalhando a irisação pela lepra do corpo que outro(s) abraça(m).
Como, afinal, impedir o gesto de ave sobre o papel ou o bailado de chamas dentro do cárcere corpóreo? A resposta, despicienda, escreve-se e inscreve-se na raiz das ondas e no claro entendimento de todos os iniciados.
Dos campos de sarças rola sempre um melancólico e sedutor olhar que é português e universal. Do consistente aproveitamento de referências e de motivemas resulta, ultrapassada a “maldição das vozes”, um clamor ostensivamente nómada e solitário. Como diz Cioran, “somos o tempo”; e é ainda do fundo de tempo que se levantam as imprecações al bertianas que convocam as horas, as memórias e os dias: “que horas serão dentro do meu corpo?”.
Al Berto cruza o tempo e os seus Mestres, de tudo se alimentando sem pressa. Com Baudelaire traz a cidade à poesia, com uma outra voz e um diferente medo. “acumulei infindáveis cadernos escritos; era esta a única maneira de remediar o medo”, ouço. Vinda dos litorais desaparecidos, esta é uma voz próxima e distanciada do mar. Dialógica e irrepetível.
Olho por dentro o Poeta e a “noite dos espelhos” (Manuel de Freitas) na minha recordação. “na cal viva da memória dorme o corpo.” Revela-se então a peste, vinda do fundo. E o medo amargo.
Encostado ao palco tmn do sudoeste, “quase luz nenhuma” – recordo. Liam Gallagher sobe ao palco e traz a serpente da música. “don’t believe the truth” encosta-se agora ao “ácido das noites em sépia”. Os Oasis são agora os peixes da madrugada “à procura do silente lume das cassiopeias”. Al Berto ainda na humidade do sonho. E os acordes de “Live Forever”.
Finalmente, o fogo sobre o mar.
2 comentários:
....porque o mar apaga o fogo?....
bom dia e beijo.
boa tarde amigo
e parabéns...
que contes muitos e que eu veja
ó velhote eu bou-te gamar a picture do Al Berto pró Disse-me. há muito que procuro uma com qualidade, principalmente esta à caravaggio...
grande abraço
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